O relacionamento político dos EUA com os países da América Latina nunca foi tão ruim. Enquanto os americanos prestavam atenção às guerras que estavam lutando no Afeganistão, no Iraque e contra o terrorismo em escala global, um tsunami de anti-americanismo varria o Hemisfério Ocidental.
A renovação democrata do Congresso Americano nas recentes eleições prometia um ajuste de políticas que contribuissem para remediar esse anti-americanismo exacerbado. Mas o discurso de líderes políticos latino-americanos, ecoando em muito os discursos do Presidente Chavez, não tem ajudado a acomodar as tensões. O barômetro político parece anunciar chuvas e trovoadas no confronto intransigente dos americanos e da América Latina na defesa de seus interesses nacionais.
No bojo dessas posturas, mais emocionais do que racionais, uma vela de pragmatismo econômico alavanca acordos econômicos bilaterais entre países da América Latina e os EUA. O Peru é o mais recente passageiro da travessia para um Tratado de Livre Comércio com os EUA, a ser negociado pelo ex-presidente Toledo sob a liderança do atual Presidente Garcia. Já a Colômbia, cresce a taxas de 6% a/a com o apoio americano para a política econômica do Presidente Uribe. Se os países andinos avançam silenciosamente na direção de um crescimento econômico, aqui no Cone Sul avançamos silenciosamente, de mão dadas, Brasil e Argentina principalmente, rumo a uma das mais graves crises que já vivemos.
No caso do Brasil observamos uma redução do consumo de petróleo em 3% aa, devido à estagnação da economia. Em 2005 nos encontrávamos no mesmo patamar de produção 1.8 milhões de barris/dia que estávamos em 1998. Embora tenhamos alcançado a auto-suficiência nominal na produção de petróleto, isso não significa o fim das importações do óleo diesel, lembrando que esse derivado é a base da matriz logística nacional de transporte de cargas. Embora o gás natural possua grande potencial para aplicação industrial, ele participa com apenas 8,8% do total da energia primária consumida dos pais. Com razão, os empresários estão reticentes em converter suas indústrias para esse tipo de fonte de energia em face da incerteza da continuidade de seu abastecimento. A situação da energia elétrica não é melhor, com diversas usinas hidráulicas pendentes de continuidade de obras por questões ambientais.
Tecnicalidades a parte, o quadro aponta um dilema. Se o Brasil crescer a taxas superiores a 2,8%, enfrentaremos uma crise de energia. Se não crescermos a taxas equivalentes (não necessariamente iguais) aos países andinos perdemos competividade internacional, mergulhando o país em um círculo vicioso negativo. O interessante é que o escape desse dilema econômico passa fortemente pela redefinição da política exterior brasileira, abrindo espaço para novos mercados e investimentos. Nunca antes em nossa história tivemos um alinhamento tão forte entre decisões na esfera da política exterior, estratégias econômicas e opções de desenvolvimento nacional.
Estamos experienciando uma nova estrutura de entrelaçamento de esferas de competência na condução das macro-políticas públicas em um ambiente aonde os impactos dessas políticas sobre empresários, gestores municipais e consumidores em geral tem uma ação muito mais curta e direta. Daí uma das razões da crescente importância do analista internacional. Mas, enquanto análise é importante, ela não se esgota em si mesmo. Decisões e ações movem o mundo. E é nesse sentido que olhamos com expectativa e atenção para as decisões do segundo mandato presidencial. Ou encaramos o desafio de fazer nossa política exterior instrumentalizar o desenho e consecução de arranjos político/comerciais dentro de um mercado internacional competitivo-cooperativo, aonde os EUA serão sempre o ator primário, ou estaremos fadados a viver sob o dilema da crise de energia no horizonte: se crescer o bicho pega, se não crescer o bicho come!
Prof. Dr. Salvador Raza, Diretor do CeTRIS
razas@cetris.com.br