Há dez anos, começou a ser escrita uma das páginas mais deploráveis da história jurídica e institucional do Brasil. Um enredo de perseguições e fraudes processuais que destruíram empresas, desmantelaram a infraestrutura nacional, devastaram vidas, deixaram 4,4 milhões de desempregados e desacreditaram as instituições. Criada em 17 de março de 2014, a operação Lava Jato foi extinta em 2021, mas o país ainda se esforça para reverter os prejuízos causados pela ambição política de um grupo de juízes e procuradores totalmente descomprometidos com a lei e a democracia.
A Lava Jato foi criada em Curitiba pelo Ministério Público Federal no Paraná (MPF), a época do governo Dilma Rousseff. A pretexto de combater a corrupção, Sergio Moro, então juiz responsável pelos processos da operação, Deltan Dallagnol, o aliado que coordenava a força-tarefa, e outros agentes públicos usaram seus cargos, as verbas e a estrutura do Estado para cometer uma série de ilegalidades, atualmente sob investigação no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Conselho Nacional de Justiça ((CNJ).
Com o envolvimento da mídia corporativa e articulados, secretamente, com o FBI (a polícia federal americana) e o Departamento de Justiça dos Estados Unidos, os integrantes da força-tarefa atuaram contra a soberania e os interesses políticos e econômicos do Brasil. O golpe inicial foi desestabilizar o país politicamente, com uma grande ofensiva contra os governos do PT, por meio de acusações infundadas, prisões e condenações de integrantes do partido. A atuação do grupo foi decisiva para a consecução do golpe contra Dilma em 2016.
O alvo era Lula
Em meio às atividades da Lava Jato, era bastante perceptível que o principal alvo da força-tarefa era Lula. Vários acusados que prestaram depoimento à Polícia Federal, por exemplo, relataram depois que foram pressionados por investigadores para envolver o nome do presidente em irregularidades.
Em 7 de abril de 2018, Lula foi preso por ordem de Sergio Moro e levado de São Paulo para a carceragem da Polícia Federal em Curitiba. À época, ele despontava como favorito na disputa pela presidência da República, seguido por Jair Bolsonaro.
Após vencer as eleições, Bolsonaro convidou Moro para ser ministro da Justiça e Segurança Pública no seu governo. O ex-juiz aceitou a recompensa, deixando escancarada a verdade por trás da prisão de Lula.
Bolsonaro é uma das heranças mais abjetas deixadas pela Lava Jato, um fascista que, além de realizar um péssimo governo, coleciona uma longa lista de crimes, incluindo a conspiração golpista para implantar uma nova ditadura militar no país.
A desmoralização definitiva da Lava Jato se deu a partir de junho de 2019: o site The Intercept Brasil lançou uma série de reportagens baseada no vazamento de conversas realizadas através do aplicativo Telegram por Moro, Dallagnol e outros membros da força-tarefa. O conjunto de reportagens, que ficou conhecido como Vaza Jato, revelou os métodos ilegais utilizados pelo grupo, como o fato de Moro dar orientações a Dallagnol sobre processos contra Lula.
Posteriormente, o STF resgatou definitivamente a inocência de Lula, considerando ilegais as quatro ações da Lava Jato contra o presidente. Nessas decisões, Moro foi declarado parcial e suspeito contra Lula, além de incompetente para julgá-lo. Além disso, vários processos da Lava Jato contra integrantes do PT também foram anulados.
Lula foi posto em liberdade pelo STF em 8 de novembro de 2019, após resistir heroicamente a uma prisão injusta que durou 580 dias. Foi a consagração do movimento Lula Livre, que uniu a militância, políticos, advogados e representantes da sociedade civil em uma grande mobilização pela soltura do presidente. Eleito para um terceiro mandato em 2022, Lula está novamente ao lado desse grupo, desta vez para reverter o quadro de destruição promovido pela Lava Jato e por seus governos aliados.
Os desafios não são poucos. Para se ter uma noção, um estudo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) apurou que as investidas da Lava Jato contra empresas e estratégicos setores de infraestrutura fez o Brasil perder R$ 172,2 bilhões em investimentos e encerrou 4,4 milhões de empregos.
Segundo os técnicos do Dieese, deixou-se de investir no país um valor 40 vezes maior que os R$ 4,3 bilhões que o Ministério Público Federal diz ter recuperado com a Lava Jato. Os cofres públicos deixaram de arrecadar R$ 47,4 bilhões em impostos, R$ 20,3 bilhões deles em contribuições sobre a folha de salários.
Os pesquisadores também afirmam que o setor mais atingido foi o da construção civil, que perdeu 1,1 milhão de postos de trabalho.
Outro levantamento, do professor Eduardo Costa Pinto, do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pesquisador do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis Zé Eduardo Dutra (Ineep), demonstrou que a Lava Jato destruiu os pequenos e médios fornecedores da Petrobras e, consequentemente, atuou para o fechamento de milhares de postos de trabalho.
A indústria naval não é citada nesse estudo, mas foi igualmente destruída em razão das acusações e processos da Lava Jato.
“Dez anos de Lava Jato, que custou ao país a destruição do estratégico setor de exportação de serviços, engenharia, óleo e gás, a condenação de 4 milhões de pessoas ao desemprego e incalculável, mas imenso, prejuízo à economia do país”, disse a presidenta do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), na rede social X.
“A herança política da Lava Jato, cujo único alvo real era Lula, foi a eleição de um presidente de extrema-direita em 2018, que por pouco não reinstaurou a ditadura no país. Sua herança institucional foi o descrédito nas instituições, especialmente do Ministério Público e do Judiciário, que hoje se esforçam para reconstruí-la”, acrescentou a deputada, que concluiu: “Foi uma experiência dolorosa que, apesar dos imensos danos causados ao país, ao estado de direito e à democracia, nos deixou como lição a resistência heróica do presidente Lula e daqueles que o apoiaram na defesa de sua inocência”