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quinta-feira, setembro 19, 2024

A última oportunidade do governo Lula

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Para Antonio Gramsci, filósofo e fundador do Partido Comunista Italiano, crise política é sinônimo de desacordo entre o pensamento hegemônico do “stablishment civil”, ou seja, do setor formador de opinião que compõe a sociedade civil de um país e o das forças políticas que ocupam o poder. Esse conceito, segundo Gramsci, é válido para países mais complexos, com um sistema capitalista razoavelmente desenvolvido. Nesses países, para consolidar o poder, não basta aos partidos políticos “tomarem” o Estado, é necessário também, que suas idéias alcancem hegemonia dentro da sociedade civil.

É baseado nesse conceito gramsciano, que poderemos entender melhor a crise política enfrentada nos últimos meses pelo governo Lula. Quando assumiu o governo, Lula delegou a área econômica ao ministro Palocci, a área de comunicação e estratégia ao ministro Gushiken e a área política ao ex-ministro José Dirceu.

Palocci, a pedido de Lula, intensificou a política de ajuste fiscal e controle da inflação do governo anterior. Isso trouxe tranqüilidade ao setor financeiro internacional, revertendo sua desconfiança. O ministro Gushiken montou uma bem sucedida estratégia de afirmação da imagem do presidente, mostrando-o como um homem de origem popular que vivenciou os grandes problemas da população excluída, ao contrário dos presidentes anteriores, que vindos da elite, nunca sentiram na pele a fome e a miséria. Para o José Dirceu cabia a tarefa de montar uma base política majoritária que desse apoio às medidas enviadas ao Congresso.

Desde o início do governo, a sociedade civil começou a ter a percepção de que o PT, capitaneado por José Genoíno e José Dirceu, montou uma estratégia de ocupação dos principais postos da máquina pública. A cabeça de vários ministérios e estatais foram de fato ocupada por indicações dos líderes dos partidos aliados do PT, no entanto, os cargos inferiores, que de fato têm acesso aos recursos públicos, foram ocupados por pessoas indicadas pela executiva do PT. Essa estratégia de domínio do aparelho de Estado levou a opinião pública a perceber que o PT não tinha projeto de governo e sim projeto de poder.

Para impedir a realização dessa estratégia, o stablisment, passou a perseguir de maneira sistemática, o ex-ministro José Dirceu. Depois do flagrante de corrupção de seu auxiliar direto, Waldomiro Diniz, a pressão ficou ainda mais forte para que Dirceu deixasse o cargo de ministro da Casa Civil do governo Lula. Por falta de determinação de Lula, Dirceu permaneceu por mais 16 meses no governo, até que o ex-presidente do PTB, Roberto Jefferson, denunciou a prática do chamado “mensalão”. Dia 16 de junho, José Dirceu entregou o cargo e voltou para o Congresso Nacional como Deputado Federal eleito por São Paulo.

A demora em tirar Dirceu do governo foi um dos principais erros do presidente Lula. Durante o período em que Dirceu ocupou a Casa Civil, não havia acordo entre o pensamento hegemônico da sociedade civil e a estratégia imprimida pelo governo na área política. Deu-se, portanto, segundo as idéias de Gramsci, as condições para o estabelecimento da crise.

Diante do fato consumado, cabe agora ao presidente Lula aproveitar a ocasião para fazer as reformas necessárias, tanto no campo político como no campo administrativo. Uma reforma política que reduza o número de partidos, discipline o financiamento de campanhas e impeça o troca-troca de partidos e uma reforma administrativa que reduza drasticamente o número de ministérios e os cargos em comissão, que racionalize os gastos com a máquina pública, são urgentes e necessárias.

Além das reformas políticas e administrativas, o governo precisa resolver seu problema fiscal. Somente zerando o déficit nominal do setor público, é possível reduzir os juros reais, controlar a inflação, evitar a supervalorização do câmbio, diminuir a relação dívida líquida do setor público sobre o PIB e, sobretudo, gerar recursos para investimento em infra-estrutura para geração de emprego e renda no país.

Se o presidente Lula perceber que o atual momento de crise pode ser uma excelente oportunidade para se afastar do ideário corporativo do PT e construir junto à sociedade uma aliança pragmática baseada em valores éticos e princípios gerenciais sadios, ele terá dado um importante passo para sua reeleição. No entanto, se Lula cair na retórica petista que quer convencer a sociedade que a atual crise é fabricada pelos setores conservadores para desestabilizar um governo de esquerda, ele vai ter, na melhor das hipóteses o mesmo fim de José Dirceu.

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