O modelo de desestatização da Dataprev e do Serpro está em estudos no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) desde 2021 e o governo de Jair Bolsonaro (PL) tem pressa em vender esse patrimônio público, apesar de todos os riscos apontados.
O Grupo de Trabalho Tecnologia da Informação e Comunicação da Câmara de Consumidor e Ordem Econômica do Ministério Público Federal (MPF) decidiu apurar o impacto da privatização da Dataprev, criticada por diversas entidades, principalmente por causa da segurança dos dados da população, das empresas e do próprio Estado brasileiro, e dos riscos à soberania nacional. O grupo tinha encaminhado nota técnica sobre os riscos da privatização do Serpro ao Ministério da Economia em fevereiro de 2021.
A investigação, que pode barrar a privatização, interessa aos trabalhadores e a toda a sociedade pois trata-se de proteger o Brasil e os brasileiros, segundo avaliações de especialsitas e sindicalistas, que detalham e explicam as razões.
“A soberania do Brasil estaria comprometida uma vez que as informações relativas a praticamente todas as pessoas físicas e jurídicas existentes no território nacional, incluindo dados pessoais sensíveis, correm grande risco de cair nas mãos de conglomerados internacionais, possibilitando todo tipo de jogo político e comercial, além disso, serviços tipicamente de Estado poderão ser monopolizados por empresas privadas”, explicou Léo Santuchi, presidente da Associação Nacional dos Empregados da Dataprev (Aned).
“A Dataprev atua como guardiã dos dados que estão sob sua custódia, protegendo assim a privacidade do cidadão em uma época em que agências internacionais são acusadas de monitorarem brasileiros e o vazamento e, principalmente, uso indevido de dados dos usuários são recorrentes, como em casos recentemente reportados na imprensa em relação a gigantes da tecnologia, em relação a gigantes da tecnologia como Facebook, Google, Apple, Amazon e outras,” afirma o presidente da Aned.
Outro risco seria a paralisação ou descontinuidade de serviços dos quais dependem milhões de brasileiros e brasileiras, ressalta Léo, se referindo aos sistemas ligados a programas como Seguro-Desemprego e Abono Salarial do PIS/PASEP, dados do CAGED, Intermediação de mão de obra, este essencial para o funcionamento dos postos do Sistema Nacional de Empregos (SINE), diz o dirigente.
Este ano, por exemplo, trabalhadores reclamaram por ter direito ao abono salarial do PIS/PASEP e não ter recebido. Foi a Dataprev quem revisou os cadastros e garantiu o direito. Um dos motivos para o não pagamento foi o fato das empresas terem errado na hora de preencher a Relação Anual de Informações Sociais (Rais).
Governo tem pressa em privatizar
O modelo de desestatização da Dataprev e do Serpro está em estudos no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) desde 2021 e o governo de Jair Bolsonaro (PL) tem pressa em vender esse patrimônio público, apesar de todos os riscos apontados.
De acordo com Léo Santuchi, no início de maio deste ano, o BNDES publicou o replanejamento do cronograma de desestatização da Dataprev, fazendo com que a última etapa, celebração do contrato com o comprador, fosse realizada no 3º trimestre de 2023. Isso representaria atraso de 6 meses.
Porém, diz o dirigente, após mudanças no comando Secretaria Especial do Programa de Parcerias de Investimentos, órgão do Ministério da Economia, o cronograma foi mais uma vez alterado, retornando à versão anterior.
Em seguida o Ministério da Economia pressiona o Tribunal de Contas da União (TCU) para que a avaliação de venda do Serpro seja realizada no último trimestre de 2022. “Ou seja, querem de qualquer forma acelerar o processo em ano eleitoral”, diz o presidente da Aned.
A Anec sistematizou e resumiu os riscos ao país, à sua soberania e à população, caso a Dataprev seja privatizada.
Confira:
- A soberania do Brasil estaria comprometida uma vez que as informações relativas a praticamente todas as pessoas físicas e jurídicas existentes no território nacional, incluindo dados pessoais sensíveis e dados sensíveis para o Estado brasileiro, correm grande risco de cair nas mãos de conglomerados internacionais, possibilitando todo tipo de jogo político e comercial;
- Serviços tipicamente de Estado poderão ser monopolizados por empresas privadas, pois sua transferência à iniciativa privada não altera sua característica, e terem sua execução ameaçada ou comprometida;
- O Estado deixaria de cumprir seu papel negligenciando direitos fundamentais como segurança, em sua interpretação mais ampla incluindo a digital, privacidade e proteção de dados pessoais do cidadão;
- Falhas ou descontinuidade de serviços poderão gerar impactos imediatos ao país e o dever de indenizar ao Estado, que mesmo podendo agir regressivamente contra o contratado, não terá garantias de recuperar seus prejuízos, gerando despesas onde antes não existiam, e o pior, deixará de atingir seus objetivos. Empresas privadas “quebram” se desinteressam etc., e o refém é o Estado;
- Suspensão de serviços críticos devido a atrasos de pagamento
- A competitividade das empresas no setor privado estaria comprometida, pois um controlador privado irá deter informações precisas sobre faturamento, lucro, quadro de funcionários e clientes de sua concorrência direta ou indireta, permitindo todo tipo de tratamento escuso;
- O cidadão estará exposto às mais diversas formas de discriminação e prejuízos, diante da possível discriminação viabilizada por cruzamentos feitos com os dados disponíveis,
- Uso de dados para interesses alheios aos da população
- Aumento de custos para o Estado.
- Necessidade de reestatização no futuro.
O valor estratégico da Dataprev: Questão de soberania digital e segurança nacional
RISCO de paralisação de sistemas ligados ao programa Seguro-Desemprego, Abono Salarial, CAGED, Intermediação de Mão de Obra, este essencial para o funcionamento dos postos do Sistema Nacional de Empregos (SINE).
Privatizar a Dataprev significa que o Estado irá:
- Transferir para o setor privado o poder das informações geradas através do cruzamento dos dados de toda a população brasileira e de todas as pessoas jurídicas;
- Desprezar o potencial de recursos que as bases de dados sob sua guarda fornecem, em um momento em que se vivie a chamada “economia de dados”;
- Reduzir sua independência social e tecnológica;
- Deixar a população em uma situação de vulnerabilidade quanto ao mau uso de seus dados.