Imagens mostram PMs escondendo fuzil, escolhendo equipamentos e desviando peças automotivas durante megaoperação; cinco militares já foram presos, e investigação mira participação de outros agentes
Vídeos de câmeras corporais usados na megaoperação nos Complexos do Alemão e da Penha, no Rio de Janeiro, expuseram uma série de irregularidades cometidas por agentes do Batalhão de Choque e do BOPE. Cinco policiais militares foram presos após serem identificados furtando armas, equipamentos e até peças de uma caminhonete durante a ação. O Ministério Público denunciou os envolvidos por peculato, enquanto a Corregedoria da PM abriu processo administrativo disciplinar e ampliou as investigações.
>> Siga o canal do Jornal Local no WhatsApp
A operação, realizada em outubro nas comunidades do Alemão e da Penha, tinha como objetivo desarticular grupos armados e localizar esconderijos de armas. Mas as gravações feitas pelos próprios policiais revelaram condutas que contrariam frontalmente normas operacionais e a legislação penal.
Em uma das cenas, o sargento Marcos Vinícius Ferreira Silva Vieira aparece encontrando um fuzil AK-47 com cabo de madeira envernizada, modelo que não constava entre as armas oficialmente apreendidas na operação. O militar, junto ao sargento Charles William Gomes dos Santos, esconde o armamento dentro de uma mochila, sem comunicar a equipe responsável pela coleta e catalogação do material bélico.
As imagens também mostram outros agentes retirando retrovisores e a tampa do motor de uma caminhonete encontrada na comunidade. Os objetos são colocados dentro da viatura, sem registro, indicando tentativa de desvio.
Outro trecho flagra um policial do BOPE separando colete, rádio e outros equipamentos para levar consigo, ação igualmente irregular e incompatível com protocolos de apreensão. O sargento Diogo da Silva Souza, por sua vez, foi apontado pelo Ministério Público como responsável por não entregar um fuzil recolhido após troca de tiros.
Prisão de cinco PMS
Na última sexta-feira, foram presos o subtenente Marcelo Luiz do Amaral e os sargentos Eduardo de Oliveira Coutinho, Diogo da Silva Souza, Charles William Gomes dos Santos e Marcos Vinícius Ferreira Silva Vieira. A defesa de Diogo alega que as imagens ainda precisam ser periciadas e que a decisão judicial careceria de fundamentação. Os demais acusados não foram encontrados pela reportagem do Fantástico.
A Polícia Militar informou que todos responderão a processo administrativo disciplinar, além das acusações criminais já oferecidas.
As gravações sugerem que parte dos desvios ocorreu após momentos de confronto, quando as equipes se dispersaram em casas e vielas. Um ponto de atenção para investigadores é a possível existência de um padrão: armas de valor elevado, como fuzis de origem estrangeira, teriam sido ocultadas ao longo de outras operações?
A Corregedoria cruza, neste momento, relatórios de armamento apreendido com imagens de câmeras corporais de diferentes batalhões para identificar lacunas. O MP quer saber também quem dentro da cadeia de comando teria sido informado ou poderia ter se beneficiado dos desvios.
Um dos indícios analisados é o fato de o AK-47 encontrado possuir características não comuns às apreensões mais recentes, o que suscita dúvida sobre sua origem e destino. Há ainda questionamentos internos sobre a fiscalização da logística de recolhimento de armas, considerada hoje um ponto vulnerável pelo setor de Inteligência da corporação.
A acusação de peculato pode levar a pena de até 12 anos de prisão. O MP avalia ampliar a denúncia caso fique comprovado que os agentes dissimularam provas, suprimiram registros oficiais ou atuaram para acobertar colegas — infrações previstas no Código Penal Militar e alvo de decisões recentes do STF que reforçam o dever de transparência no uso de equipamentos de gravação.
Promotores também analisam se houve associação criminosa entre os envolvidos, já que alguns vídeos mostram ações coordenadas de desvio. Caso isso se confirme, as penas podem aumentar.
Nos bastidores, oficiais criticam a exposição pública do caso, mas reconhecem que as câmeras corporais vêm gerando “um divisor de águas” na disciplina interna. Policiais ouvidos reservadamente afirmam que a Corregedoria já monitorava condutas suspeitas de alguns dos detidos e que a operação apenas consolidou evidências.




