Texto relatado por Guilherme Derrite enfrenta resistência dentro da base governista; Planalto articula adiamento da votação para evitar derrota e renegociar pontos que afetam a autonomia da PF
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), colocou na pauta desta terça-feira (11) a votação do Projeto de Lei Antifacção, proposto pelo governo Lula para reforçar o combate ao crime organizado. A medida, porém, se tornou o mais recente foco de tensão entre governo e oposição, após o relator do texto, o deputado Guilherme Derrite (PP-SP) — atual secretário de Segurança Pública de São Paulo — incluir mudanças consideradas inaceitáveis pela Polícia Federal (PF) e pelo Ministério da Justiça.
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No Planalto, a palavra de ordem é adiar a votação. Integrantes da Secretaria de Relações Institucionais, liderados por Gleisi Hoffmann (PT), passaram a segunda-feira (10) em articulação com líderes partidários para empurrar a análise para outra data. Além de tentar recompor a base, o governo quer ganhar tempo para rever o texto. Parte dos deputados governistas está fora de Brasília, em Belém (PA), acompanhando eventos preparatórios da COP30, o que poderia enfraquecer o quórum aliado no plenário.

O principal ponto de discórdia é o papel da Polícia Federal nas investigações sobre facções e milícias. A primeira versão apresentada por Derrite determinava que a PF só poderia atuar mediante solicitação dos governadores, o que, na prática, limitaria a autonomia da corporação em grandes operações. A reação foi imediata: a PF divulgou nota pública afirmando que a proposta “compromete o interesse público” e cria “risco real de enfraquecimento do combate ao crime organizado”.
Diante da pressão, Derrite e Hugo Motta se reuniram com o diretor-geral da PF, Andrei Passos Rodrigues, e anunciaram ajustes. O texto revisado devolveu parte da autonomia à Polícia Federal, prevendo que suas ações poderão ocorrer por iniciativa própria, desde que comunicadas às autoridades estaduais. Ainda assim, dentro do governo, a leitura é de que a medida continua insuficiente.
O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (PT-RJ), foi direto: “Ele continua atacando a Polícia Federal, tentando transformar um instrumento de Estado em refém de interesses políticos. Isso é inegociável.” Nos bastidores, ministros da Justiça e da Casa Civil avaliam que a redação proposta pode restringir o alcance de investigações federais em casos de corrupção, tráfico e milícias com ramificações políticas.
Outro ponto de debate envolve a tentativa de equiparar as ações de facções criminosas a atos de terrorismo, proposta originalmente discutida no PL nº 1.283/2025, o chamado “PL do Terrorismo”. Diante da resistência de economistas e diplomatas, que alertaram para possíveis impactos internacionais e fuga de investimentos, essa parte foi retirada do texto. Mesmo assim, Derrite manteve a previsão de penas de 20 a 40 anos de prisão para líderes de facções — a mesma faixa aplicada a crimes de terrorismo.
O Planalto considera a mudança desproporcional e teme que o projeto seja usado para “blindar” agentes políticos ligados ao crime organizado. Lindbergh Farias afirmou que “a matança de anônimos virou cortina de fumaça para esconder a aliança entre o poder e o crime. O Brasil não vai aceitar esse golpe de impunidade”.
A votação segue incerta. Caso não haja acordo nas negociações de hoje, o governo deve insistir em adiar a deliberação, buscando ajustar o texto em diálogo com o Ministério da Justiça, a PF e os líderes partidários. Até lá, o PL Antifacção permanece como um dos temas mais sensíveis da agenda de segurança pública e política no Congresso.




