Zibia Gasparetto é, realmente, um fenômeno. Esta pode até ser uma frase feita, mas, talvez, seja a única capaz de resumir a história da escritora de livros espíritas que completa 82 anos amanhã, dia 29 de julho. Nascida em Campinas, interior de São Paulo, Zibia aprendeu a ler aos quatro anos de idade, mas não estudou além do quarto ano do antigo ensino primário. Tornou-se escritora psicografando livros (capacidade atribuída aos médiuns de escrever mensagens ditadas por Espíritos). São 31 títulos publicados – 24 são romances ditados pelo espírito Lucius -, com a surpreendente tiragem de mais de 9,2 milhões de exemplares e uma legião de 25 milhões de leitores.
Desde 1989, quando fundou a Editora e Gráfica Vida e Consciência no bairro do Ipiranga, em São Paulo, ela e o filho Luiz Antônio Gasparetto, também escritor, doam os direitos autorais de suas obras para lançar novos autores que, também, escrevem histórias – psicografadas ou não – que ajudem as pessoas a viverem melhor.
Mais de oito décadas de vida e cinco de carreira não são suficientes para que Zibia Gasparetto pense em parar. Aposentadoria é uma palavra que não existe em seu amplo vocabulário. Pela sua vitalidade, energia e disposição para o trabalho, a impressão que se tem é a de que a autora está apenas começando.
Embora ainda comemore o sucesso de seu mais recente livro, o suspense espírita Onde está Teresa?, que vendeu cerca de 200 mil exemplares em apenas seis meses, a escritora preparou mais uma publicação que chegará às livrarias à época de seu 82º aniversário. Sob o título Eles continuam entre nós, o novo livro traz histórias reais narradas pelos próprios leitores sobre a interferência dos espíritos em acontecimentos que não podem ser explicados pela lógica materialista.
“Acreditar na vida após a morte do corpo físico é uma questão de vivência, mas a maioria só busca esse esclarecimento quando perde alguém da família ou quando passa por uma situação de dor. Só a certeza de que você é eterno, de que tudo no Universo é perfeito e que a vida responde de acordo com o que você lhe dá permitirá a descoberta das verdadeiras causas dos acontecimentos e modificará o seu modo de ver e de fazer suas escolhas”, ensina a escritora.
Zibia em seu escritório na Editora Vida e Consciência
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Workaholic
O ritmo de trabalho de Zibia Gasparetto assemelha-se ao dos jovens profissionais que buscam um lugar no mercado de trabalho, com a diferença de que, para ela, o sucesso sempre permeou todas as suas obras ao longo dos 50 anos de carreira. A escritora é muito disciplinada: trabalha de segunda a sexta-feira na Editora e Gráfica Vida e Consciência, que administra junto com os filhos Luiz Antônio e Silvana e com os netos Vanessa e René. As duas empresas empregam cerca de 200 funcionários.
Três tardes são reservadas para a psicografia dos livros. A autora está produzindo três diferentes obras no momento. As segundas, terças e sextas-feiras, a partir das 14hs, Zibia apaga as luzes de seu escritório e coloca uma música suave. Até que as luzes voltem a ser acesas, ninguém a interrompe.
“Por ter sido tão beneficiada pela crença na espiritualidade é que continuo escrevendo, inspirada pelos espíritos desencarnados ou relatando minhas próprias experiências. Esta é uma forma de agradecer à vida todo o bem que esse conhecimento me trouxe”, explica.
A escritora também integra o Conselho Editorial, responsável pela análise e aprovação das obras de outros autores. São 11 escritores publicados no momento, entre eles Mônica de Castro, cujas obras também figuram na lista dos mais vendidos, e Marcelo Cezar. A descoberta mais recente é a estreante Vera Lucia Claro que lançou, em maio, o livro Stef – A Sobrevivente e Lucimara Galícia, autora do romance espírita Sem medo do amanhã.
Ao lado dos filhos Luiz Antônio e Irineu, Zibia administra, ainda, o Centro de Estudos Vida e Consciência, mantenedor dos Espaços São Paulo e Rio de Janeiro e o Metacenter, um SPA urbano para aconselhamentos metafísicos e tratamentos bioenergéticos.
Às quintas-feiras pela manhã Zibia Gasparetto apresenta, ao vivo, o programa Conversando com você na Rádio Mundial. Atende seus ouvintes com paciência e carinho, assim como responde, pessoalmente, os centenas de e-mails e cartas que recebe de seus fãs. Seus conselhos – de mãe, avó, irmã ou amiga – são tão bem aceitos quanto às histórias de seus livros.
Em público, não deixa de atender ninguém. Numa das últimas vezes que decidiu ir a uma livraria bater-papo com seus leitores formou-se uma fila de mais de 400 pessoas querendo seu autógrafo, uma foto ao seu lado ou uma palavra de carinho. Ganhou uma tendinite. Por isso começou a reduzir os compromissos públicos. “Não posso deixar de atender quem fica horas na fila para me ver”, justifica.
Best sellers
Praticamente todos os livros de Zibia Gasparetto são best sellers e figuram na lista dos mais vendidos tão logo chegam às livrarias. Por isso, suas obras são aguardadas com ansiedade pelo mercado. Não existe uma única publicação com apenas uma edição. Seus livros batem recordes de tiragem, como Ninguém é de ninguém, de 2000, cuja tiragem ultrapassou um milhão de exemplares.
A menor tiragem foi do livro O mundo em que vivo, crônica da vida espiritual do jornalista Silveira Sampaio, que teve também a surpreendente tiragem de 90 mil exemplares, mesmo sendo lançado em 1987, ano da publicação de Laços eternos, outro sucesso de vendas (tiragem de aproximadamente 800 mil exemplares).
Os leitores identificam-se com suas obras. As histórias que narra tratam sempre de situações corriqueiras, que podem acontecer com o próprio leitor, com um amigo dele ou um vizinho. Porém, são contadas sob um ângulo que permite ao leitor refletir sobre as causas e conseqüências de cada situação e, consequentemente, compreender melhor a vida.
Zibia acredita que a presença constante de suas obras nas listas dos livros mais vendidos no país deve-se à forma simples da narrativa das histórias contadas pelos espíritos e à profundidade das mensagens que transmitem. “Os leitores sentem na alma porque as histórias são contadas por espíritos. As partes das histórias que mexem com as pessoas me emocionam, também. Quando estou psicografando parece que sinto as emoções e as angústias dos personagens: choro, sofro e, também, sorrio com eles. Com o público não acontece diferente. Os espíritos sabem como fazer esta ligação com a nossa alma”, define.
A maior parte das histórias não traz vítimas nem vilões. “As mensagens fazem com que os leitores compreendam que eles têm o poder de mudar as próprias vidas, modificando sua maneira de pensar. Algumas pessoas aprendem mais rapidamente do que outras. Mas, para todas, existe a possibilidade de crescimento espiritual”, comenta.
O sucesso de seus livros é tão grande que dois dos seus romances foram adaptados para o teatro – Laços eternos e O amor venceu -, com grande sucesso de bilheteria. Outro sucesso editorial da escritora, Ninguém é de ninguém está prestes a ser levado para as telas de cinema por intermédio de uma das maiores produtoras do país.
Suas obras também já foram publicadas no Exterior: Portugal (Amanhã a Deus pertence e Ninguém é de ninguém), Colômbia (Sem medo de viver e Ninguém é de ninguém), Espanha (1998 – Pelas portas do coração) e Japão. Em breve os livros da maior romancista espírita brasileira poderão chegar aos leitores da Itália, França, Alemanha e Rússia.
A autora não se importa com críticos que não reconhecem suas obras como literárias. Para ela, o que importa são as mensagens que superam a simplicidade da escrita: elas tocam a alma das pessoas e transformam as suas vidas. Zibia lança pelo menos um livro por ano. Às vezes dois. Este ano, serão pelo menos três lançamentos.
Seu principal mentor é o espírito Lucius, que a inspira na maioria das histórias que escreve. Sobre ele, Zibia só sabe o que o próprio revelou no livro O fio do destino, em que relata duas de suas encarnações na Terra: a mais antiga, como membro do parlamento inglês e, a outra, como escritor e juiz na França. Para ela, Lucius tem sido um mestre. “Suas energias são prazerosas e quando ele se aproxima, meu pensamento torna-se claro, lúcido. Nos primeiros tempos em que trabalhamos juntos, ele costuma andar comigo e, conforme o lugar, as cenas que eu presenciava me orientavam, fazendo-me ir mais fundo nas observações. Agora, na maioria das vezes, apenas sinto a sua presença e ouço a sua voz, ditando as palavras do texto que eu digito no computador”.
Mediunidade
A ligação de Zibia Gasparetto com o mundo espiritual está presente na vida da escritora desde os seus 22 anos de idade. Uma noite, seu marido, Aldo, a surpreendeu andando com passos firmes pela casa e proferindo, com voz grave, frases em alemão, idioma que ela nunca estudou. Assustado, Aldo pediu ajuda a uma vizinha que o acalmou e esclareceu que se tratava de um espírito.
A partir de então, Aldo e Zibia aprofundaram-se no estudo da doutrina de Allan Kardec (pseudônimo do pedagogo e escritor francês Hippolyte Léon Denizard Rivail, que codificou a Doutrina Espírita) e passaram a freqüentar as reuniões da Federação Espírita de São Paulo, onde, por 25 anos, ministrou cursos na Escola de Médiuns.
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Zibia participava como médium de incorporação, psicografava contos, mensagens de orientação e histórias e, algumas vezes, chegou a usar o dom da xenoglossia (faculdade de falar ou escrever línguas estranhas). Seu braço doía e a mão mexia contra a sua vontade. Quando papéis eram colocados à sua frente e lápis em suas mãos, Zibia escrevia rapidamente.
Foi assim que os romances começaram a fluir. O primeiro foi O Amor Venceu, ditado pelo espírito Lucius e que levou mais de cinco anos para ser escrito. Ela tinha, então, dois filhos pequenos e foi entre uma mamadeira e outra que conseguiu concluir a obra.
Quando datilografado e pronto, Zibia solicitou a opinião de um professor de História da Universidade de São Paulo (USP) que, à época, dirigia um grupo de estudos na Federação Espírita. Quinze dias mais tarde, o professor a informou ser ele o responsável pela escolha dos livros a serem publicados pela Editora LAKE. Sua obra era boa e a editora desejava publicá-la. Zibia Gasparetto não parou mais. A escritora atingiu, em 2007, a impressionante marca de 31 livros publicados.
No início, os livros eram manuscritos. Depois, datilografados. Hoje Zibia utiliza um computador. Embora mantenha a consciência, garante não interferir na obra. “Eu nunca sei para onde segue a história. É sempre uma surpresa. Aliás, eu só sei quem é o autor ao final do trabalho, quando o espírito assina a sua obra”, afirma. Lucius, o espírito que inspira Zibia Gasparetto na maioria das histórias que ela escreve, apenas identificou-se quando assinou, após cinco anos de trabalho, a última página do livro O Amor Venceu.
Em 1969 a escritora fundou o Centro de Desenvolvimento Espiritual Os Caminheiros, onde desenvolveu extenso trabalho de esclarecimento e de promoção social dos menos favorecidos por 26 anos consecutivos. Foi em Os Caminheiros que teve a idéia de fundar a editora que levou o nome do Centro Espiritual responsável, até 1989 pela publicação de seus livros. Diante da necessidade de separar a parte espiritual da editora, criou naquele ano, em sociedade com o filho Luiz Antonio, o Centro de Estudos Vida e Consciência Editora Ltda., que reúne a editora e a gráfica que ela administra até hoje ao lado de parte da família.
Entre setembro de 1993 e janeiro de 1997 Zibia foi colunista da Revista Contigo. Os textos, publicados em 176 edições da revista, resultaram no livro Conversando Contigo!. As mensagens falam sobre sonhos, reencarnação, morte, universo, mediunidade e outros assuntos relacionados à espiritualidade. Desde junho de 2008, a escritora Zibia Gasparetto voltou a escrever para uma publicação semanal, a revista Viva Mais!, respondendo às dúvidas espirituais dos leitores.
Sem rótulos ou dogmas religiosos
Avessa a qualquer tipo de rótulo e contra os dogmas que cerceiam as religiões, Zibia Gasparetto prefere definir-se como espiritualista e ignorar alguns espíritas que a criticam pelo fato da família ter a editora também como fonte do sustento.
“Fundamos uma empresa séria e sólida, que paga todos os impostos e emprega 200 pessoas. O Luiz e eu, desde o início, não recebemos os direitos autorais para que o dinheiro seja reinvestido na editora e permita que outros autores também possam publicar os seus livros. Acredito que tenhamos recebido tanta ajuda do plano espiritual para manter a nossa editora porque a nossa missão é disseminar as mensagens transmitidas pelos espíritos ou que contribuam para tornar as pessoas melhores. Publicar um livro não é fácil. Há muitos autores que fazem uma verdadeira peregrinação pelas editoras sem conseguir publicar suas obras. Nós oferecemos esta oportunidade a todos os que tenham uma boa história para contar ou que o texto auxilie na compreensão da vida”, destaca.
A escritora ri ao questionar onde estaria a fortuna que dizem que a família tem. “Meus filhos trabalham na administração da editora e do curtume (Cortidora Brasitânia Ltda, em Mogi das Cruzes, São Paulo) que meu marido (Aldo faleceu em março de 1980) nos deixou. Eles recebem os salários compatíveis aos cargos que exercem e às tarefas que executam. E, todos, são muito trabalhadores”, diz.
Descendente de italianos casou-se aos 20 anos de idade e tem quatro filhos: Pedro, o mais velho, e Irineu (o terceiro), administram o curtume herdado do pai; Luiz Antonio é psicólogo e escritor; e, Silvana é o braço direito da mãe na editora Vida e Consciência, onde também trabalham dois, de seus nove netos, Vanessa e René. Zibia tem três bisnetos.
Há 36 anos mora na mesma casa, no bairro do Ipiranga, em São Paulo, próxima à editora. Entre tantas ações benemerentes que sempre praticou, a família mantém, há mais de 20 anos, a Fundação Aldo Gasparetto que atua com a profissionalização de jovens em situação de vulnerabilidade social na produção de artigos de couro.