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quinta-feira, novembro 21, 2024

Bolívia: opção ou contramão da história?

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Desde que tomou posse em janeiro, o Presidente Evo Morales, vem procurando implantar uma série de reformas, buscando cumprir a promessa de retirar a Bolívia da condição de país mais pobre da América do Sul. Se por um lado não se pode contestar a legitimidade moral e social dessa proposta, por outro, na prática, as coisas não vão bem.

Dificuldades econômicas e oposição política internas, aliadas à perda de credibilidade internacional, arriscam erodir rapidamente os enormes 70% de apoio popular que ainda sustentam o primeiro presidente indígena da Bolívia. Em maio, dias após anunciar que todas as companhias estrangeiras teriam que ceder seu controle operacional para a estatal boliviana de energia, em meio a fortes reações internacionais, o governo temporariamente suspendeu a implantação plena do programa de nacionalização devido a falta de fundos.

A Assembléia convocada para reescrever a constituição suspendeu seus trabalhos sob a alegação de que Morales e seus seguidores estariam criando artificialidades no processo constituinte, para conquistar excessiva autonomia na definição de metas e na gestão pública acima do Congresso e do Judiciário, enquanto removiam os mecanismos de prestação de contas.

Greves de professores para tornar compulsório o ensino da língua indígena, greve dos carteiros contra políticas de pessoal, protestos dos motoristas contra novos procedimentos de registro automotivo, protestos contra o aumento do valor das multas, protestos de funcionários da saúde e ocupação de gasoduto, são alguns indicadores de uma população impaciente por resultados pragmáticos em termos de mais empregos e melhor distribuição de renda. População essa que amadureceu rapidamente a capacidade de exercer sua vontade democrática, sobre forte liderança do próprio Morales, que ajudou a depor dois presidentes entre 2003 e 2005.

Infelizmente, a capacidade de exercer a vontade política parece não ter sido acompanhada da cultura política necessária para entender que os resultados serão lentos para serem sólidos e permanentes. Só que Morales está consumindo seu estoque de tempo mais rapidamente do que suas reformas criam um estoque financeiro para alavancar seus projetos de recuperação nacional.

Para comprar mais tempo, enquanto promete continuar com as privatizações de matérias primas e capacidades produtivas, Morales tende a radicalizar mais ainda seu discurso populista, rebatendo críticas, tais como as de que seu programa é radical demais e que possui pouco lastro em competências de gestão pública, com a afirmação de que “isso não passa de ataque da oligarquia e da ala reacionária de direita”.

Entretanto, tempo somente não será suficiente. Para sobreviver, o projeto Morales precisará do apoio da liderança brasileira. Estima-se que um apoio de cerca de U$ 100 milhões dos EUA teria mantido o ex-presidente Gonzalo Sánches de Lozada no poder. Os americanos negaram-lhe esse apoio. O Brasil teria que pagar algo em torno de U$ 1 bilhão para ajudar Morales a se manter no poder por pelo menos mais um ano, para que seu projeto possa ter alguma chance de sucesso.

Uma opção complicada, já que ela custeia, de fato, uma ideologia embutida em um projeto duvidoso de recuperação nacional, que se alicerça sobre uma lógica econômica pautada pela estatização que ainda não deu certo em lugar nenhum do mundo. Nesse sentido é que gostaríamos de ver mais transparência nos propósitos e compromissos que o Brasil deverá assumir com a Bolívia; afinal, somos nós que pagaremos a conta.

Prof. Dr. Salvador Raza,
Analista de Relações Internacionais

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