Foi publicada no Diário Oficial da União (DOU), nesta terça-feira (31), a sanção do presidente Lula ao ‘Marco Legal das Garantias’, que reformula as regras sobre a garantia real dada em empréstimos, como hipoteca ou alienação fiduciária de imóveis.
A maior mudança é a que permite que o mesmo imóvel seja dado como garantia para dois empréstimos. Por exemplo: antes um imóvel de R$ 200 mil só poderia ser usado como garantia para uma única operação de crédito até a quitação do valor — ainda que a dívida seja de valor menor, como de R$ 50 mil. Agora, os R$ 150 mil restantes do bem também poderão servir como garantia em outros empréstimos. Veja abaixo outras mudanças com a nova lei.
O Projeto de Lei foi enviado ao Congresso Nacional em 2021, no governo de Jair Bolsonaro (PL) e sofreu diversas modificações tanto na Câmara Federal como no Senado e somente foi aprovado nas duas Casas Legislativas no último dia 3 de outubro.
Entre as diversas mudanças propostas e aprovadas pelo Congresso Nacional, a que permitia a tomada de um veículo por falta de pagamento sem ordem judicial foi vetada por Lula. Pela proposta vetada, os procedimentos seriam realizados perante os Detrans, por meio de empresas especializadas em registro centralizado, que fariam todos os atos de processamento da execução.
De acordo com o texto publicado pelo DOU, o presidente justificou o veto afirmando que é inconstitucional. O trecho diz que “ao criarem uma modalidade extrajudicial de busca e apreensão do bem móvel alienado fiduciariamente em garantia, acabaria por permitir a realização dessa medida coercitiva pelos tabelionatos de registro de títulos e documentos, sem que haja ordem judicial para tanto, o que violaria a cláusula de reserva de jurisdição e, ainda, poderia criar risco a direitos e garantias individuais, como os direitos ao devido processo legal e à inviolabilidade de domicílio”.
Veja o que muda
Cria a possibilidade de uso de medidas extrajudiciais para recuperar crédito por meio de cartórios, permitindo ao credor fazer proposta de desconto por intermédio de tabelionatos de protesto.
Com comunicação por carta simples, correio eletrônico ou aplicativo de mensagem instantânea, o tabelião informará ao devedor sobre a proposta, que pode prever prazo de até 30 dias para aceite. Se o devedor não aceitar, o comunicado será convertido em indicação para protesto. Se esse tipo de negociação extrajudicial tiver sucesso, os emolumentos cartoriais serão pagos sobre o valor efetivamente quitado.
Em prazos de 31 a 120 dias, contados do vencimento do título ou do documento de dívida, o credor deverá antecipar a taxa devida à central nacional de serviços eletrônicos compartilhados pelos serviços prestados. Se a negociação ocorrer após 120 dias, todos os emolumentos e demais despesas deverão ser pagas antecipadamente pelo credor.
Incentivo à renegociação – Outro dispositivo permite ao credor delegar ao tabelião a proposta de medidas de incentivo à renegociação, inclusive podendo receber o valor da dívida já protestada e indicar eventual critério de atualização desse valor. Se a dívida for liquidada dessa forma, caberá ao devedor arcar com os custos de emolumentos pelo registro do protesto e seu cancelamento, e demais despesas.
WhatsApp – Outra mudança aprovada permite ao tabelião de protesto de qualquer tipo de dívida não paga enviar intimação para o devedor por meio de aplicativos de mensagem instantânea (WhatsApp, por exemplo). Essa intimação será considerada cumprida apenas com a funcionalidade de recebimento liberada na plataforma.
Prova de vida – Em relação aos cartórios, mais uma emenda acatada muda a lei de registros públicos para permitir aos cartórios de registro civil das pessoas naturais emitirem certificados de vida, de estado civil e de domicílio físico ou eletrônico do interessado. Para isso, deverá haver um convênio com a instituição interessada e comunicação imediata e por meio eletrônico a ela da prova de vida atestada.
Exclusões – Foram aprovados também temas como: manutenção do monopólio da Caixa no penhor civil; retirada de outros casos que permitiriam penhorar o único imóvel da família; exclusão da possibilidade de usar o direito minerário como oferta de garantia; e retirada da isenção do Imposto de Renda para aplicações, no Brasil, feitas por residentes no exterior.
Segunda alienação
De acordo com o projeto, uma segunda dívida poderá ser garantida por imóvel que está sendo comprado com o instrumento da alienação fiduciária em nome do credor do financiamento imobiliário. Mas sua eficácia dependerá do cancelamento daquela constituída anteriormente. Se houver alienações fiduciárias anteriores, elas terão prioridade em relação às mais novas se a garantia for executada (venda do imóvel). A partir desse momento, a garantia para os credores posteriores passa a incidir no preço obtido com a venda, cancelando-se os registros das respectivas alienações fiduciárias.
Para o credor fiduciário que pagar toda a dívida do devedor garantida pelo imóvel, o texto prevê que ele ficará sub-rogado no crédito e na propriedade fiduciária em garantia, ou seja, ficará com os direitos fiduciários dos outros credores. A regra de vencimento antecipado de toda a dívida se alguma prestação não for paga valerá inclusive para a segunda alienação fiduciária.
Mesmo credor
A proposta permite ainda ao devedor contrair novas dívidas com o mesmo credor da alienação fiduciária original, dentro do limite da sobra de garantia da operação inicial, contanto que seja no âmbito do Sistema Financeiro Nacional e nas operações com Empresas Simples de Crédito (ESC), que concedem empréstimo, financiamento e factoring (aquisição de direitos creditórios) exclusivamente para microempreendedores individuais (MEI), microempresas e empresas de pequeno porte.
Uso do mesmo credor para novas empréstimos – A exceção é que se o valor garantido por um imóvel no primeiro empréstimo for de até R$ 100 mil e a dívida original for de R$ 20 mil, o devedor poderá tomar novo empréstimo junto ao mesmo credor em valor de até R$ 80 mil.
No entanto, não poderá haver operações garantidas pelo mesmo imóvel com outros credores; e todas as operações garantidas poderão ser transferidas pelo credor apenas conjuntamente e para um único novo titular.
Agente de garantia
O projeto cria ainda a figura do agente de garantia, que será designado pelos credores e atuará em nome próprio e em benefício dos credores. Ele poderá fazer o registro do gravame do bem, gerenciar os bens e executar a garantia, valendo-se inclusive da execução extrajudicial quando previsto na legislação especial aplicável à modalidade de garantia. Terá ainda poder de atuar em ações judiciais sobre o crédito garantido.
Esse agente poderá ser substituído a qualquer tempo por decisão do credor único ou dos titulares que representarem a maioria simples dos créditos garantidos. Após receber o valor da venda do bem dado em garantia, o agente deverá realizar o pagamento aos credores em dez dias úteis. Enquanto não for transferido para os credores, esse dinheiro constituirá patrimônio separado daquele do agente de garantia e não poderá responder por suas obrigações pelo período de até 180 dias.
Apesar de ser um representante dos credores, esse agente também poderá manter contratos com o devedor para pesquisar ofertas de crédito mais vantajosas entre os diversos fornecedores, ajudar nos procedimentos para a contratação de nova dívida para quitar a que está garantida ou oferecer serviços não vedados em lei.
Fontes: Agência Senado e Agência Câmara