A Editora da Universidade Federal de São Carlos (EdUFSCar) está lançando o livro “Vestidas e afeitas para serem virtuosas: as mulheres na Castela dos séculos XIV e XV”, de autoria de Thiago Henrique Alvarado. A obra conta como as legislações laical e religiosa foram decisivas para o estabelecimento de regras que ajudaram a corrigir a aparência dos fiéis cristãos.
O livro é resultado da dissertação de mestrado desenvolvida por Alvarado, cujo tema surgiu das leituras, ainda na Iniciação Científica, dos escritos castelhanos do final da Idade Média.”Embora a temática da minha pesquisa, na ocasião, fosse outra, esta impressão da importância das vestimentas no reconhecimento dos estados (termo que se referia aos grupos sociais) permaneceu e veio a ser retomada, posteriormente, na confecção do projeto de mestrado. Assim, ao direcionar as minhas leituras às vestimentas, fui levado a uma série de leis, comuns ao Ocidente medieval, denominadas pela historiografia de ‘leis suntuárias’. Estas leis visavam à restrição, e mesmo à proibição em alguns casos, de certos objetos suntuosos, como as vestes, com o intuito de preservar a diferença entre os estados, evitar os excessos e estimular a modéstia. Entre os alvos dessas leis, sobressaíam as mulheres, acusadas com certa frequência de excessos e cuidados demasiados com a aparência”, explica o autor.
A pesquisa, desenvolvida sob a orientação de Susani Silveira Lemos França, docente da Universidade Estadual Paulista (Unesp), interroga como na Castela dos séculos XIV e XV, as vestimentas e os adornos das mulheres passaram a ser alvo de uma série de prescrições que visavam à sua moralização. Desta forma o objetivo do livro foi inquirir, a partir de um conjunto de escritos normativos e edificantes, sobre os valores e as regras que deveriam pautar a conduta das mulheres castelhanas no trato de sua aparência.
Os principais pontos destacados na obra são referentes às relações intrínsecas que deveriam existir entre as vestes e os estados e entre as vestes e os corpos. “A preocupação com as vestes amparava-se na concepção tida por natural de que elas davam a conhecer o interior. Assim, em uma época em que as diferenças entre os estados deveriam ser expressas pela aparência, as vestimentas permitiam o reconhecimento à primeira vista do estado, da condição, da dignidade, da religião e do sexo da pessoa”, diz Alvarado. Ainda segundo o pesquisador, em relação às mulheres, o simples fato de trazerem a cabeça coberta permitia saber, por exemplo, se eram casadas ou não. Manter os cabelos soltos era permitido às mulheres casadouras (em idade e condições de casar). No entanto, alguns desses aspectos poderiam acarretar confusões entre os estados ou entre mulheres de condições distintas. “Preservar as diferenças era manter a disposição das coisas criadas por Deus, cabendo ao monarca corrigir as faltas dos seus súditos, o que ocorria, entre outros meios, pelo ordenamento de leis e da aplicação da justiça”, destaca o autor.
Ele também cita como curiosos e significativos entre os valores da época os cuidados em detalhar as vestes, em atribuir valores a todos os seus elementos, em explicitar atributos considerados naturais, que remetiam à criação e como eles traduziam exteriormente o interior da pessoa. Assim, as diferenças corporais entre as mulheres e os homens refletiam-se nas vestes. “O cuidado excessivo com as vestes e os adornos poderia gerar diversos pecados e males, como a vanglória, a luxúria e o dispêndio das rendas da casa, que ameaçavam não apenas a salvação delas, mas de todos ao seu redor. Faltas, portanto, que significavam muitas vezes um pecado e um crime, um desrespeito às leis humanas e à vontade divina, e que justificavam a correção e instrução das mulheres tanto por laicos quanto por religiosos, por meio das leis, da confissão e da pregação”, conclui Alvarado.
O livro pode ser adquirido no site www.editora.ufscar.br.