O governo dos Estados Unidos vigiou o presidente Lula durante décadas e produziu mais de 800 documentos sobre ele, totalizando 3,3 mil páginas. Quem confirma o interesse do aparato de segurança estadunidense pelo petista é o jornalista e escritor Fernando Morais, que conseguiu acesso aos documentos oficiais. Eles revelam que a CIA (Agência Central de Inteligência, em português) e outros órgãos de defesa monitoravam Lula, pelo menos, desde 1966, ainda durante o período da ditadura, época em que o presidente era torneiro mecânico e integrava o movimento sindical no ABC paulista.
A CIA confeccionou a maior parte desses documentos, mais de 600, reunidos em 2 mil páginas. Além da agência de inteligência dos Estados Unidos, outros órgãos de segurança do país também seguiram os passos de Lula: o Departamento de Estado produziu 111 documentos; a Agência de Inteligência da Defesa, outros 49; o Departamento de Defesa contribuiu com 27; o Exército do Sul dos Estados Unidos manteve oito registros; e o Comando Cibernético do Exército, apenas um.
Para conseguir as evidências, Morais recorreu à lei de acesso à informação dos Estados Unidos, conhecida como FOIA (Freedom of Information Act), legislação que entrou em vigor exatamente em 1966, durante o governo Lyndon Johnson, auge da Guerra do Vietnã. O jornalista ainda aguarda retorno do FBI (a polícia federal estadunidense), da Agência de Segurança Nacional (NSA, sigla em inglês) e da Rede de Combate a Crimes Financeiros (FinCEN, em inglês). As respostas devem ocorrer dentro do prazo de 20 dias, prorrogáveis por mais 20.
Petrobras no alvo
A espionagem do governo dos Estados Unidos mirou também a Petrobras, os planos militares do Brasil e as relações de Lula com os governos da China e de países no Oriente Médio. Nem a ex-presidenta Dilma Rousseff (PT) escapou ao escrutínio estadunidense, afirma Morais. Sobre o atual governo Lula, o escritor antecipa não dispor de registros, pois o pedido de acesso às informações foi feito em 2019.
Esses documentos servirão à biografia do presidente, da qual Morais está encarregado. O primeiro volume foi lançado em 2021, pela Companhia das Letras, e traduzido para os idiomas inglês, espanhol e chinês. Ainda não foi fixada data para a divulgação da segunda parte da obra.
Soberania nacional
A presidenta nacional do Partido dos Trabalhadores (PT), deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), classificou como “gravíssimas” as revelações do biógrafo de Lula. Para a parlamentar, o governo dos Estados Unidos é afrontoso à soberania do país. “O Pentágono e o Comando Militar do Sul também estão na lista, espionando nossa defesa, as relações internacionais, a produção de petróleo e sabe-se lá o que mais”, criticou, no “X”.
“Espionavam Lula desde 1966, quando se filiou ao sindicato, no PT, na presidência e até na prisão. E não foram só as famigeradas CIA e NSA. (…) A denúncia do jornalista certamente vai lançar novas luzes sobre os crimes da Lava Jato contra Lula e o Brasil. Além de ser uma inaceitável violência contra um cidadão brasileiro, a arapongagem é uma afronta à soberania nacional.”
No mesmo tom, o deputado federal Odair Cunha (PT-MG), líder da bancada do partido na Câmara, disse que a espionagem estadunidense é “uma violação inaceitável contra o povo brasileiro e contra a soberania do nosso país”. “As denúncias de que Lula e o Brasil foram espionados durante décadas pelos EUA são extremamente graves”, definiu o parlamentar.
“E também reforça o que sempre dissemos: patriota de verdade é quem se preocupa com os interesses da própria nação, e não quem bate continência e se submete, com orgulho, a outros países”, concluiu.
Também por meio das redes sociais, o senador Fabiano Contarato (PT-ES) condenou, “nos mais firmes termos”, a arapongagem dos EUA contra o Brasil. “A espionagem dos EUA contra Lula é uma afronta inaceitável à nossa soberania. Essa investida abusiva não mira apenas um cidadão, mas um chefe de Estado, atingindo assim todo o país”, censurou.