Mais de 1,3 milhão de clientes estão sem luz na região metropolitana
As cidades da Região Metropolitana de São Paulo seguem enfrentando apagões desde terça-feira, após a passagem de um ciclone com ventos acima de 100 km/h. Mais de 10% da população ainda estava sem energia até a noite desta quinta-feira (11), quando moradores da chamada Vila da Biquinha, às margens da Via Anhanguera, bloquearam completamente a pista sentido capital, na altura do km 19, região do Pico do Jaraguá. O protesto começou por volta das 19h e refletiu a exaustão acumulada por dias de falta de resposta efetiva da concessionária Enel.
>> Siga o canal do Jornal Local no WhatsApp
No Jardim Orly, zona sul, a professora Leila Lasnaux vive situação semelhante desde as 10h de quarta-feira. Uma árvore caída derrubou fios algumas ruas abaixo de sua casa. Técnicos da Enel estiveram no local, mas deixaram a área sem realizar reparos, alegando que a remoção da árvore dependia da prefeitura. Até as 18h de quinta, o tronco continuava no mesmo lugar. A família perdeu carnes, peixes e verduras, precisou almoçar fora e improvisa com um gerador de baixa potência para manter celulares carregados e tentar preservar alimentos.

O episódio se repete. Em novembro do ano passado, o bairro de Leila ficou cinco dias no escuro. “Só resolveram quando saiu na imprensa. Nosso medo é acontecer de novo”, disse.
No Butantã, a roteirista Erica Chaves também está sem luz desde o meio-dia de quarta-feira. Ela voltava do mercado quando encontrou a casa às escuras, com compras da semana que agora começam a se perder. A Enel mudou a previsão de restabelecimento ao menos cinco vezes. Sem bateria no celular, ela precisou caminhar quatro quarteirões até achar uma residência com energia para não perder uma reunião de trabalho. “O pior é o desamparo. As previsões simplesmente não se cumprem. Não há como se planejar”, afirmou.
No bairro Raposo Tavares, a situação envolve até risco de colapso dos geradores. A síndica profissional Regina Mantovani relata que o condomínio onde vive – com sete torres e quase mil unidades – opera com geradores a diesel, mas enfrentou dificuldade para abastecer. Sem energia nos postos, as bombas de combustível não funcionam. “Já fiz três viagens hoje atrás de diesel. Nosso galão suporta duas horas. É uma corrida contra o tempo”, disse.
Falhas estruturais e protocolos rompidos
A crise revela um conjunto de problemas que vão além da ventania:
• Protocolo quebrado entre Enel e prefeituras — pela regra, após queda de árvore, equipes de poda municipais devem liberar o acesso para reparo elétrico. Em vários bairros, esse fluxo simplesmente não se cumpriu, deixando moradores presos num limbo administrativo.
• Previsões automatizadas e inconsistentes — a concessionária vem atualizando horários de restabelecimento por sistemas automáticos, sem relação com a presença real de equipes em campo. O resultado é um ciclo de promessas que não se concretizam.
• Falta de estoque de equipamentos críticos — funcionários relatam internamente que a empresa entrou na semana com déficit de transformadores e cabos para reposição rápida após eventos climáticos severos.
• Dependência de geradores em regiões densamente povoadas — a rede de prédios residenciais em bairros como Raposo Tavares, Jaguaré e Butantã depende de geradores, mas sem abastecimento contínuo o sistema entra em colapso em poucas horas.
Impactos econômicos e sociais silenciados
Ainda pouco contabilizados, os danos incluem:
• perda de alimentos em massa em áreas de menor renda;
• interrupção de serviços médicos domiciliares;
• queda de internet em regiões inteiras, afetando teletrabalho;
• aumento de tensão em condomínios e conflitos com síndicos;
• bloqueios espontâneos de vias, como o registrado na Anhanguera.
A crise pressiona a Enel, já alvo de investigações e processos por falhas recorrentes na distribuição. Moradores afirmam que somente após grande repercussão pública, como em 2023, a empresa acelerou atendimentos.




