Pedro J. Bondaczuk
A Academia Campinense de Letras completa, em maio de 2006, meio século de existência, como uma das guardiãs da cultura e da tradição de Campinas. Idealizada pelo saudoso professor Francisco Ribeiro Sampaio e presidida, atualmente, por Rubem Costa, acolhe, entre os seus membros, profissionais de diversas áreas: professores, médicos, advogados, odontólogos, sacerdotes, juízes, jornalistas etc. Ou seja, vencedores em suas atividades e todos ligados pelo elo comum do amor à arte de bem escrever.
Mas, ao contrário do que supõem os mal-informados, não se trata de uma torre de marfim, em que os acadêmicos se encerrem para discutir o sexo dos anjos. Nem de um museu de mentes fossilizadas. Trata-se de uma instituição viva, dinâmica, participativa e, sobretudo, moderna. Há uma grande confusão acerca de dois conceitos, bastante citados, mas pouco compreendidos: modernidade e tradição.
Ao contrário do que se pensa, não são atitudes excludentes, mas complementares. Não se opõem, portanto, como se pretende, mas se completam. Há determinados valores morais, éticos e estéticos que independem do tempo para permanecerem válidos. Foram testados e aprovados, através de gerações, e sem eles a cultura de um povo fica descaracterizada, amorfa, vazia. Por isso, precisam ser preservados e, quando possível, melhorados. Esta é a tradição que a Academia conserva.
Todavia, os acadêmicos são homens do nosso tempo. São, antes de tudo, cidadãos, com uma obra reconhecidamente sólida em favor da sociedade, em suas respectivas atividades profissionais. São pessoas vencedoras. Mas vivem a mesma realidade de cada ser humano, neste início de milênio, e a mesma de cada habitante deste país jovem, cheio de conflitos e contradições, à procura de caminhos para se realizar enquanto nação.
Não são, portanto, pessoas perdidas no tempo, fossilizadas, retrógradas, estagnadas, que façam de literatura mero passatempo de beletrista, sem nenhuma utilidade. Aplicam seu talento, testado e comprovado no âmbito cultural da cidade, para trazer problemas à baila, dissecar emoções, analisar comportamentos e apontar soluções para as graves questões nacionais, quer no âmbito da cultura, quer no social, quer no político etc.
Isto, sem perder de vista o patrimônio artístico campineiro, rico e variado, sua literatura, sua história, suas conquistas e dissabores, que sem esse templo do saber correria o risco de se perder no esquecimento, numa sociedade que não sabe preservar sua memória. E, mesmo que se trate de um clichê, nunca é demais lembrar que povo que não tem passado não pode aspirar a um futuro. Daí os acadêmicos serem conhecidos como imortais.
Claro que essa imortalidade não é, e nem poderia ser, física. Como seres humanos, uns mais cedo, outros com idade mais avançada, todos cumprimos o inexorável ciclo biológico e um dia nos extinguimos. É a lei da vida.
O que não morre na Academia é a obra dos escritores campineiros. É a chama da razão que caracteriza os seus intelectuais. É essa paixão que move os artistas e os grandes realizadores. Nossa imortalidade (e digo “nossa” porque tenho orgulho de integrar a Academia há já treze anos) reside na certeza de que, mesmo após a nossa extinção física, nossos sonhos, amores, saudades, dores, ilusões e desilusões permanecerão vivos a atestar que existimos, que fomos humanos e, sobretudo, que fomos úteis.
Daí deriva o símbolo da casa de Francisco Ribeiro Sampaio (o mesmo da cidade de Campinas, que consta em seu brasão), a fênix, ave mitológica que, conforme a lenda, renascia das próprias cinzas. O renascimento do acadêmico ocorre na pessoa daquele que o sucede em sua cadeira. Revive, nas sessões mensais, quando sua vida e obra são reportadas, repetidas, dissecadas, analisadas, estudadas, apreciadas e, sempre que possível, quando se obtém uma brecha nos meios de comunicação, divulgadas à sociedade.
Está de parabéns, portanto, a Academia Campinense de Letras pelo 50º aniversário que completou em 17 de maio de 2006 e por sobreviver e se consolidar enquanto instituição, num período difícil, tumultuado e até caótico da história cultural brasileira. Está de parabéns Campinas, por contar com este templo de saber, que preserva e compatibiliza modernidade e tradição!