PGR pede mais provas, e negociações podem reabrir diante de novos relatos
O empresário Roberto Augusto Leme da Silva, conhecido como Beto Louco, tenta fechar um acordo de delação premiada que envolve políticos de projeção nacional — entre eles o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP). O movimento ocorre no momento em que duas operações distintas, conduzidas pelo MPF e pelo Ministério Público de São Paulo, avançam sobre um suposto esquema de lavagem de dinheiro do PCC no setor de combustíveis no estado.
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A delação foi inicialmente oferecida ao MPF do Paraná, responsável pela Operação Tank, e ao MP-SP, que conduz a Operação Carbono Oculto. Como a proposta citava autoridades com prerrogativa de foro, o caso foi remetido à Procuradoria-Geral da República. No fim de novembro, advogados do empresário se reuniram com o procurador-geral Paulo Gonet, que analisou o material.

A avaliação interna foi de que a proposta não apresentava elementos suficientes para sustentar acusações contra políticos com foro privilegiado. Gonet devolveu o caso à primeira instância, mantendo o entendimento de que uma colaboração sem provas concretas — sobretudo envolvendo autoridades — poderia comprometer investigações em curso.
Beto Louco segue como um dos principais investigados das duas operações. Ele é apontado como peça central no elo entre postos de combustíveis, distribuidoras regionais e empresas de fachada supostamente usadas pelo PCC para movimentar valores sem rastreamento. Fontes próximas ao caso afirmam que promotores adotam postura de cautela para medir até onde a eventual delação contribuiria para desvendar toda a cadeia de lavagem.
Estrutura societária e empresas-chave
- Duvale / Copape — apontadas em denúncias e planilhas apreendidas como veículos de distribuição e revenda; promotores sustentam que Beto Louco mantinha participações informais majoritárias em empresas desse grupo, mesmo quando o quadro societário oficial indicava terceiros.
- Terra Nova Trading (Tocantins) — citada como importadora que teria trazido nafta a um custo tributário drásticamente inferior ao praticado em combustíveis refinados no Estado de São Paulo (uso de regimes que reduzem imposto na importação), criando margem artificial na cadeia.
- Gestoras, holdings e fundos de fachada — estrutura de empresas de participação que funcionariam como interface entre recursos operacionais e o patrimônio final, dificultando o rastreio direto aos beneficiários. Relatos indicam mudanças societárias rápidas logo após o início das operações policiais.
Mecanismo financeiro investigado
- Adulteração / recalibração fiscal: compra de insumos com tratamento tributário reduzido + operação de blending/adulteração para revenda como combustíveis refinados com margem ilegal.
- Camadas de intermediação: uso de gestoras e empresas de fachada para ocultar origem e destino de pagamentos (factoring, empresas de consultoria e “gestoras” apontadas nas apurações).
- Saída internacional e blindagem patrimonial: movimentações por fundos e sociedades que se sobrepõem ao capital declarado, segundo planilhas e quebras de sigilo relatadas.
O que a proposta de delação traz foi devolvida
- A defesa de Beto Louco apresentou relatos e mensagens que citariam episódios envolvendo políticos, logística de presentes (como remessas de medicamentos de alto custo) e encontros em Brasília. Veículos de imprensa divulgaram trechos que mencionam, por exemplo, o suposto fornecimento de medicamentos/itens a políticos.
- A PGR devolveu a proposta sob o argumento de que faltavam “provas concretas” vinculando autoridades com foro privilegiado aos fatos alegados — ou seja, a narrativa apresentada não vinha acompanhada dos documentos e rastros financeiros que justificassem a abertura de investigação àquele nível. A devolução não impede nova apresentação com elementos novos.
Pontos críticos que precisam ser demonstrados para a delação valer juridicamente
- Rastreamento de transações: extratos bancários, contratos de câmbio, ordens de pagamento e notas fiscais que liguem pagamentos às empresas intermediárias.
- Documentos de cadeia societária: contratos, alterações societárias, procurações, laudos contábeis e e-mails que revelem o beneficiário econômico real.
- Provas de entrega/recebimento: protocolos, logística, testemunhos ou registros que liguem diretamente a entrega de bens/valores a agentes políticos ou seus assessores.
- Créditos cruzados e fluxos internacionais: contratos de importação/exportação, movimentações em contas no exterior, declarações de importação (DI) e conhecimento de embarque (BL).
Sem esses elementos, a PGR avalia que a delação tem valor reduzido para conduzir apurações sobre autoridades com foro.
Contradições, riscos e efeitos políticos imediatos
- Contradição entre narrativa e documentação: reportagens mencionam mensagens e trocas logísticas, mas o núcleo probatório exigido pela PGR — ligações financeiras e documentais — ainda não apareceu publicamente. Isso explica a devolução inicial.
- Risco de reações políticas: citações a figuras de alta projeção — se reabertas com novos elementos — podem gerar embates institucionais e pressões sobre a condução do processo, incluindo pedidos de investigação paralela e controvérsias sobre escopo e foro.




