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segunda-feira, outubro 21, 2024

Omissão da Aneel e reincidência da Enel exigem mudança de modelo regulatório, diz ministro

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O ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira, evitou qualquer frase abertamente acusatória contra a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) no caso do mais recente apagão na Grande São Paulo, região atendida pela concessionária Enel. Mesmo assim, não deixou dúvida: a agência regulatória foi omissa, o que permitiu à concessionária prestar um mau serviço.

Silveira, em entrevista coletiva concedida na tarde desta quarta (16/10), disse que o Governo Federal não pode agir diretamente sobre a Enel sem o “devido processo legal”, sob pena de ser desautorizado por força de liminar, e que esse processo já deveria ter sido encaminhado pela agência reguladora. “A Aneel se omitiu em relação à abertura desse processo”, afirmou o ministro. “E nós determinamos que isso fosse feito no ano passado”, completou.

Ele disse que o modelo baseado em agências regulatórias, criado nos anos 1990, está defasado. “Eu tenho absoluta convicção de que se o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que criou as agências reguladoras, estivesse participando disso, ele estaria pensando da mesma forma”, afirmou Silveira. O ministro disse defender o papel das agências, que, segundo ele, conferem segurança aos investidores. Mas que “nenhum órgão está imune a aperfeiçoamentos”.

Indagado se o atual Governo tem projeto para essa mudança, ele disse: “Não há nada esboçado, mas espero que seja esboçado e encaminhado rápido”. Silveira criticou as agências por extrapolarem a ideia de autonomia. “Uma coisa é autonomia, outra coisa é soberania, supremacia.” Para ele, é preciso alterar a correlação de forças entre o poder de um representante eleito pelo voto popular, como o presidente da República, e uma agência reguladora.

Mudanças já feitas

O ministro destacou que o Governo Lula já editou decreto-lei, em abril deste ano, que determina novas exigências para futuras concessões. Uma das novas exigências foi incluir os extremos climáticos – não considerados nos anos 1990 – na medição da qualidade dos serviços prestados pelas concessionárias. “O contrato atual é frouxo, inadequado à realidade do setor energético”, disse. “É um contrato que absurdamente expurga dos índices de medição de qualidade os eventos climáticos extremos”.

Outra nova exigência foi estabelecer o mesmo critério de qualidade para todos os bairros ou regiões atendidos pelas concessionárias. O contrato da Enel em São Paulo é baseado numa média geral, o que permite serviço ruim em algumas áreas, compensado por boas notas atingidas em bairros mais bem atendidos. Outra nova regra é a limitação de distribuição de dividendos a acionistas em caso de descumprimento das exigências contratuais. “No limite mínimo previsto em lei”, disse o ministro. “E falaram que o Governo é intervencionista”.

Silveira voltou a criticar a privatização da Eletrobras, “o último braço que o Governo tinha para socorrer os brasileiros em momentos extremos”. Ele lembrou que o ministério foi obrigado a recorrer à ajuda de outras concessionárias no apagão da Grande São Paulo, que cederam equipamentos e pessoal para tentar retomar o abastecimento.

Aneel

Silveira não falou a respeito da composição atual da Aneel, nem foi perguntado a respeito. Mas parte da Aneel, incluindo a presidência, é composta por diretores nomeados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, que além de colocar esses dirigentes lá, ampliou de quatro para cinco anos o mandato de cada um.

A agência, ressaltou Silveira, não cumpriu a determinação de pressionar a Enel no ano passado, quando o primeiro dos grandes apagões atingiu a Grande São Paulo. O ministro lembrou que apenas multas foram dadas à concessionária que, por sua vez. recorreu à Justiça e não pagou os valores. Tampouco respeitou o acordo para ampliar o número de funcionários, com a contratação de 1.200 pessoas. A Enel só contratou 174 pessoas até o momento. E não houve punição para o descumprimento.

O ministro de Minas e Energia defendeu que a Aneel abra o chamado devido processo legal, para que então o Governo Federal possa intervir com mais severidade. Na opinião dele, a ação governamental poderia chegar a “uma intervenção com possível caducidade”. Segundo Silveira, a caducidade corresponde a “eliminar o CNPJ” da empresa, e os efeitos disso incluiriam a demissão dos trabalhadores e que a União assumisse todos os custos de uma intervenção desse porte. Outra opção seria uma passagem de controle para outra concessionária.

Choque em São Paulo

A empresa que fazia a distribuição de energia elétrica em São Paulo, até 1998, era a Eletropaulo, empresa pública que foi privatizada naquele ano, quando a venda de ativos estatais era uma das principais plataformas do governo FHC. A compradora foi a AES, dos Estados Unidos, que obteve um contrato de concessão de 30 anos. Em 2018, a AES vendeu a concessão para a italiana Enel. Tal contrato vence em 2028, sem direito a prorrogação automática – o que valeria caso a concessionária ainda fosse a AES.

O engenheiro elétrico Ikaro Chaves, da Federação Nacional dos Urbanitários, especialista no setor, observa que a Aneel é uma autarquia com independência funcional e financeira, imune à tutela. “O Ministério de Minas e Energia não pode determinar nada”, disse. Medidas mais rigorosas, como a encampação da Enel, embora prevista na lei 8987/1995, que guiou o programa de privatizações, teria de ser objeto de medida provisória, mas causaria forte reação do mercado.

Porém, a julgar pelas declarações de Silveira, o ministério estaria pronto a assumir o risco de medidas mais duras. “Eu o faço em um segundo”, disse, durante a entrevista. Mas, de novo, só depois de a Aneel cumprir a etapa de abertura do processo, sem a qual o Governo cometeria ilegalidade.

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