Ministro Lewandowski passa a defender nova pasta como condição para ampliar poder da União, centralizar ações contra o crime e destravar recursos bilionários para o setor
O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, alterou sua posição histórica e passou a defender a criação do Ministério da Segurança Pública, tema que anteriormente rejeitava. A mudança, no entanto, vem acompanhada de condicionantes duras: aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição, ampliação do papel da União no combate ao crime organizado e a destinação de recursos expressivos para a nova estrutura. Sem isso, segundo ele, a divisão da atual pasta resultaria apenas em rearranjo burocrático, sem impacto real na segurança pública.
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O novo alinhamento de Lewandowski acompanha a posição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que já deixou claro que não enviará o projeto ao Congresso enquanto a PEC não for aprovada. O ministro foi direto ao afirmar que, sem clareza institucional e aporte financeiro robusto, a criação do ministério seria inócua. Para ele, o combate à criminalidade exige dinheiro novo e coordenação nacional efetiva, e não apenas mudanças administrativas.

A guinada no discurso ocorre em um momento de disputa política intensa em torno da PEC da segurança. Lewandowski afirmou que hoje só vê sentido na divisão da pasta se houver fortalecimento do papel da União, rompendo com o modelo em que estados e municípios concentram a maior parte das responsabilidades, enquanto o governo federal atua de forma limitada. Ele citou o orçamento do Fundo Nacional de Segurança Pública como exemplo do desequilíbrio: atualmente, o fundo dispõe de cerca de R$ 2 bilhões, valor que o ministro classificou como irrisório diante da dimensão do problema. Para efeito de comparação, estados como a Bahia destinam aproximadamente R$ 8 bilhões anuais apenas para a área de segurança.
O ministro também fez críticas diretas ao texto da PEC aprovado na Câmara dos Deputados. Segundo ele, o relatório apresentado descaracterizou a proposta original do Executivo ao retirar a centralização da coordenação do combate ao crime. Na avaliação de Lewandowski, o texto aprovado caminha no sentido oposto ao Sistema Único de Segurança Pública, enfraquecendo a capacidade da União de articular ações integradas e aprofundando a fragmentação institucional.
Ao tratar de estratégias de enfrentamento ao crime organizado, Lewandowski defendeu o modelo adotado na Operação Carbono Oculto, que desvendou esquemas criminosos no setor de combustíveis. Para o ministro, a ação simboliza o caminho que o governo pretende seguir: inteligência, cooperação entre forças federais e estaduais e atuação conjunta com órgãos de controle financeiro e fiscal. Ele contrapôs esse modelo a operações policiais de grande letalidade, classificando ações com dezenas de mortos como incompatíveis com os princípios constitucionais.
No debate sobre o projeto de lei antifacção, o ministro deixou claro que o governo rejeita a equiparação entre facções criminosas e organizações terroristas. Segundo ele, essa associação poderia abrir brechas para interferências externas e colocar em risco a soberania nacional. Lewandowski elogiou as alterações feitas no Senado, que, segundo sua avaliação, resgataram quase integralmente a proposta original do Executivo.
O ministro também se posicionou contra a flexibilização de penas para crimes ligados a ataques às instituições democráticas. Ao comentar o projeto de dosimetria aprovado pelo Congresso, afirmou que a redução de sanções pode estimular novos atentados contra o Estado Democrático de Direito. Para ele, mesmo sem anistia formal, a diminuição das penas pode produzir efeitos equivalentes, contrariando entendimentos já firmados pelo Supremo Tribunal Federal.
Outro ponto sensível abordado foi a infiltração do crime organizado na política. Lewandowski atribuiu responsabilidade direta aos partidos, afirmando que a prevenção começa na escolha de candidatos e no controle do financiamento eleitoral. Segundo ele, o Estado atua de forma repressiva, mas falha quando permite que estruturas criminosas avancem sobre o sistema político por meio de legendas e campanhas.
Ao final, o ministro reforçou que a Polícia Federal atua com autonomia no atual governo e que o combate ao crime organizado seguirá como prioridade, desde que respeitados os limites constitucionais. A mudança de discurso sobre o novo ministério, no entanto, revela que a segurança pública voltou ao centro da disputa política em Brasília, agora condicionada a uma redefinição profunda de poder, orçamento e coordenação nacional.
Retranca
A defesa de um Ministério da Segurança Pública expõe uma queda de braço entre Executivo e Congresso sobre quem controla o combate ao crime organizado. Com fundos federais considerados insuficientes e resistência à centralização, a PEC da segurança se tornou o principal teste político para redefinir o papel da União e destravar bilhões em recursos públicos.




