Sessão que poderia enterrar a investigação virou, em 48 horas, um movimento de ruptura total. Sequência de imagens com ameaças, homofobia e abuso de autoridade destruiu qualquer base de apoio ao vereador do PL
O que começou como uma disputa apertada na Câmara de Campinas se transformou, em dois dias, em um isolamento político completo. A abertura da Comissão Processante contra o vereador Otto Alejandro (PL) — inicialmente vista como improvável — terminou aprovada por unanimidade nesta quarta-feira, após a divulgação de novos vídeos que ampliaram o escândalo para muito além da denúncia de suposta violência doméstica.
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Até segunda-feira, o cenário era outro. Nos bastidores, vereadores admitiam resistência em votar a favor da investigação, temendo desgaste e pressão dos aliados de Otto. Uma manobra regimentar salvou o rito: o adiamento da votação evitou que a denúncia fosse rejeitada ainda na primeira tentativa, quando o vereador ainda mantinha alguma margem de proteção política.

Mas a pausa de 48 horas abriu a porta para um terremoto. A partir da noite de segunda, uma erosão acelerada da imagem de Otto tomou forma — e tomou as redes, os corredores do Legislativo e a imprensa local.
A avalanche de vídeos
Três registros foram decisivos para virar o jogo:
- O vídeo da portaria, em que Otto humilha uma trabalhadora, usa expressões homofóbicas e demonstra comportamento agressivo.
- A gravação com Guardas Municipais, em que o vereador ameaça servidores públicos e sugere ter influência “nos de cima” do Executivo.
- O episódio da Glicério, já conhecido, mas agora reforçado no contexto de comportamento reiterado.
De repente, a denúncia original deixou de ser o centro do problema. O que estava em discussão já não era apenas uma acusação específica: era um padrão.
Com o material circulando em massa, partidos da própria base anunciaram voto favorável à Comissão Processante — algo impensável dias antes. O plenário lotou, desta vez sem apoiadores do vereador. Otto não compareceu à votação.
Quando o painel marcou 30 vereadores presentes, o resultado já estava selado: a abertura seria unânime. Ela veio por 29 votos a 0, com três ausências.
Constrangimento no sorteio da CP
Mesmo diante da gravidade do caso, a Câmara protagonizou um momento desconcertante. Sorteada como única mulher entre os três nomes para compor a Comissão Processante, a vereadora Fernanda Souto (PSOL) ficou de fora na escolha inicial — uma decisão tomada por Eduardo Magoga (Podemos) e Guilherme Teixeira (PL), que se colocaram, respectivamente, como presidente e relator.
A escolha era politicamente indefensável: um caso envolvendo violência doméstica conduzido apenas por homens. A repercussão negativa no plenário foi imediata. Sob pressão, a composição foi refeita: Fernanda assumiu a presidência, Magoga ficou com a relatoria e Teixeira permaneceu como membro.
A estratégia de Otto: narrativa de perseguição
Nas redes sociais, Otto tenta virar o jogo antes mesmo do início dos trabalhos. Publicou artes defendendo sua inocência e repetiu que a abertura da CP seria “ótima” para provar que está sendo vítima de perseguição. O discurso tenta deslocar o foco das imagens e reposicionar o caso como conspiração política. Mas o problema é que os vídeos, agora, contam outra história.
Padrão de conduta ou campanha difamatória?
1. A força probatória dos vídeos
O conjunto de imagens divulgadas cria uma linha narrativa contínua: abuso verbal, intimidação, agressividade e tentativa de usar o cargo para constranger terceiros. A defesa política fica fragilizada quando o próprio investigado aparece, repetidamente, sustentando condutas questionáveis.
2. “Perseguição política”: tese com pouca tração
Para emplacar essa narrativa, Otto precisaria desmontar a credibilidade dos vídeos, das testemunhas e dos registros já formalizados. Nada disso foi feito até aqui. A ideia de perseguição pode mobilizar sua base mais fiel, mas encontra pouca aderência no plenário — que votou de forma unânime pela investigação.
3. Câmara muda de comportamento como resposta ao risco reputacional
A votação de 29 a 0 revela que o Legislativo não estava disposto a carregar o peso de defender um vereador cercado por múltiplos registros de conduta abusiva. A mudança repentina não veio de articulação, mas de autopreservação institucional.
4. Otto entra na CP com dano irreversível
Mesmo que consiga se defender tecnicamente, o desgaste público já é profundo. A Comissão deverá avaliar não apenas a denúncia de violência doméstica, mas o conjunto de condutas que emergiu nos vídeos. Isso amplia, e muito, o risco de cassação.
A abertura da CP não foi um movimento político, mas uma reação em cadeia a fatos que vieram à tona no pior momento possível para Otto Alejandro. Em 48 horas, o vereador perdeu todas as bases de sustentação, viu sua imagem implodir em praça pública e agora enfrenta um processo que, pela força dos registros e pela unanimidade da votação, já começa com prognóstico difícil.




