Ministério Público Federal (MPF), a Procuradoria de Justiça Militar, a defensoria pública de estados e municípios têm instrumentos legais para terminar com os atos democráticos, apesar do “apagão” do Procurador Geral da República (PGR), Augusto Aras, que até o momento não tomou providências concretas contra o terrorismo praticado país afora. Foto PRF/SC
Os atos golpistas de extremistas que atiram, jogam bombas, saqueiam e impedem até ambulâncias de passar em bloqueios porque não aceitam a derrota do presidente Jair Bolsonaro (PL) para o presidente eleito, Lula (PT), nas eleições deste ano, devem ser enquadrados como terrorismo.
A afirmação é do advogado e juiz aposentado, Inocêncio Rodrigues Uchôa, um dos fundadores e membro da Executiva Nacional da Associação Brasileira dos Juristas pela Democracia (ABJD).
Ele entende que, diante da gravidade dos atos antidemocráticos, quem os comete deve ser tratado como terrorista e não como manifestante, como parte da imprensa e autoridades do atual governo vêm tratando os golpistas.
“Os atos violentos, evidentemente, são ilegais, inconstitucionais e gravíssimos. Não se pode levar como ‘patetice’ de inocentes úteis, manipulados por grupos de extrema direita, que pede intervenção militar e até alienígena. Eles estão cometendo atos terroristas e devem responder criminalmente por isso”, diz Uchôa.
Veja o vídeo em que golpistas, em Porto Alegre (RS), pedem intervenção de alienígenas para impedir a posse de Lula.
Bloquear estradas impedindo o ir e vir; invadir Casas Legislativas, pedir a intervenção das Forças Armadas e o fechamento do Supremo Tribunal Federal (STF) são algumas das práticas que têm escalado para a violência e a crueldade. Exemplos são muitos, como o caso recente de uma família que foi impedida de levar o filho para operar um dos olhos, apesar dos apelos do pai.
O pai da criança teve de voltar, encontrar uma fazenda e passar por uma estrada privada para chegar ao hospital e remarcar o horário da cirurgia. A criança foi operada e passa bem.
Em Itapema, Santa Catarina, os golpistas chegaram a agredir fortemente e promover cárcere privado de um homem que demonstrou sua insatisfação pelos atos antidemocráticos. O homem ficou em poder do grupo por pelo menos cinco horas. As imagens, gravadas pelos próprios agressores, mostram ele descoberto, sendo humilhado e agredido. Ainda no veículo, um dos bolsonaristas faz referência a um Sandrão, a quem diz “está aqui o cara do cafezinho”. Eles também obrigaram o trabalhador autônomo a gravar um vídeo se retratando.
Outros casos de desdém e crueldade vieram à tona e estão registrados nas redes sociais, como o da mulher impedida de se despedir da mãe moribunda; do coração que não chegou a tempo de ser transplantado; dos estudantes obrigados a ir a pé fazer o exame do Enem; a queima de caminhões de trabalhadores que se recusaram de bloquear estradas e da surra dada a um idoso que insistia em trafegar, além da invasão da Assembleia Legislativa de Goiás por integrantes do agronegócio, entre outros.
A gravidade da situação levou a Associação Brasileira dos Juristas pela Democracia (ABDJ) e a Associação dos Juristas pela Democracia (AJURD), a adotarem em conjunto, alguns encaminhamentos para enfrentar os atos criminosos que estão sendo praticados contra o Estado Democrático de Direito, contra os Princípios Constitucionais e contra as pessoas, para oferecer “notícias de fato” aos Ministérios Públicos Estadual, Federal, do Trabalho e perante as demais autoridades públicas competentes. Saiba como denunciar abaixo.
Para o fundador da ABDJ é preciso que a sociedade civil, os partidos políticos e os movimentos sociais e sindicais exijam das autoridades competentes o fim desses atos e a punição dos responsáveis.
Segundo Inocêncio Rodrigues Uchôa, instituições como o Ministério Público Federal (MPF), a Procuradoria de Justiça Militar, a defensoria pública de estados e municípios têm instrumentos legais para terminar com os atos democráticos, apesar do “apagão” do Procurador Geral da República (PGR), Augusto Aras, que até o momento não tomou providências concretas contra o terrorismo praticado país afora.
“Todo mundo está esperando o Lula assumir a presidência, ou o Supremo tomar alguma decisão, mas os ministros do STF só podem atuar quando provocados, como o caso da multa de R$ 22 milhões ao PL. Por isso é fundamental que a sociedade civil organizada se manifeste mais concretamente e exija que as autoridades tomem providências de fato, porque todo mundo sabe quem são os patrocinadores dos atos antidemocráticos”, defende Uchoa.
É preciso coibir na fonte os atos criminosos. Cabe a todo cidadão, individualmente ou como entidade civil, se posicionar contra o fascismo que Bolsonaro trouxe ao país, facilitando, inclusive, o acesso a armas por civis – Inocêncio Uchôa
Para o juiz aposentado, se os atos golpistas não forem reprimidos de acordo com a lei eles podem continuar, com tentativas de desgastar o governo Lula durante todo o seu mandato.
“Estão tentando levar essas manifestações para sempre e os partidos políticos e a sociedade civil não estão dando conta da gravidade da situação. Não é possível esperar mais, é preciso agir”, acredita Uchoa.
O juiz entende ainda que mais do que combater as fake news (notícias falsas) é preciso combater as notícias criminosas, como a da mamadeira em formato de pênis, que o PT, no governo Dilma Rousseff, foi acusado de criar. Notícia criminosa difundida antes das eleições de 2018, em que Bolsonaro saiu vencedor contra o petista Fernando Haddad.
“Isso é notícia criminosa, uma coisa é acreditar que Bolsonaro vai assumir o corpo de Lula para governar, como alguns que vivem num mundo paralelo estão divulgando, isso é fake news. Outra coisa é veicular atrocidades como o caso da mamadeira. Isso é crime”, conclui.
Polícias reprimem movimentos sociais
Por outro lado, os movimentos sociais e sindicalistas toda vez que tentaram bloquear estradas, claro que sem a maldade de impedir que ambulâncias e pessoas que precisavam de cuidados médicos, trafegassem, sofreram repressão policial de forma truculenta.
Um desses casos, que causou horror no país e no mundo, foi o massacre de Carajás (PA). Em 17 abril de 1996, 19 trabalhadores do Movimento dos Sem Terra (MST) foram assassinados pela Polícia Militar durante a repressão ao bloqueio na rodovia estadual PA 150.
Naquele dia, 150 policiais militares cercaram 1.500 trabalhadores rurais que se encontravam acampados nas laterais do Km 96 da rodovia estadual PA 150, reivindicando o cumprimento de acordo com o Incra e Governo do Estado, onde estava prevista a desapropriação da Fazenda Macacheira. Nenhum policial foi condenado pela Justiça.
“É claro que ir às ruas por melhores salários, eleições diretas, por algum projeto é diferente, faz parte da democracia. Atentar contra o regime democrático e ainda com gravidade de métodos violentos, é crime, é terrorismo”, afirma Uchôa.
Saiba como denunciar atos golpistas
Os canais de atendimento da ABDJ e AJURD estão disponíveis para denúncia:
- – Por WhatsApp no número (51) 99370.72.72
- – Pelo e-mail: sosdemocraciabr@gmail.com
Para a efetividade das denúncias é importante circunstanciá-las com elementos probatórios:
- – Em casos de listas circulantes em redes socias, “printar” as páginas e enviar as cópias com as denúncias;
- – Em quaisquer casos, fotografar e ou filmar as ações, para as mesmas finalidades;
- – Em qualquer caso, situar o fato, com indicação do município e local onde ocorreu; a data e, quando possível, o horário;
- – Indicar, quando possível, a autoria da prática criminosa (autor, repassador em redes sociais, integrantes de atos antidemocráticos, etc), bem como veículos utilizados (placas);
- – Quando possível, indicar testemunhas.