Cúpula da Segurança fluminense recusou apoio de 30 peritos federais após acerto com o ministro Ricardo Lewandowski; famílias ainda aguardam identificação de corpos, e tensão cresce entre Planalto e Palácio Guanabara
Por Sandra Venancio
RIO DE JANEIRO (RJ) — O governo do Rio de Janeiro dispensou o trabalho dos peritos da Polícia Federal (PF) nas autópsias dos 117 mortos em confronto com a polícia nos complexos do Alemão e da Penha, durante a operação que terminou com 121 mortes ao todo — quatro delas de policiais militares. A ação, realizada no dia 28 de outubro, já é considerada a mais letal da história do país.
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A decisão de recusar a colaboração federal foi comunicada ao Ministério da Justiça e Segurança Pública na noite de quinta-feira (30), poucas horas após o ministro Ricardo Lewandowski anunciar o envio de 30 peritos federais ao Rio, em acordo prévio com o governador Cláudio Castro (PL).

Em mensagem enviada ao ministério, a Secretaria de Segurança Pública do Rio (SSP-RJ) alegou que as equipes da Polícia Civil e do Ministério Público Estadual já haviam concluído as necropsias dos corpos, e que, portanto, “os governos estadual e federal poderiam avançar em outros assuntos”.
A justificativa, no entanto, contradiz informações oficiais. No mesmo dia em que o secretário de Segurança afirmou ter finalizado os trabalhos, familiares de vítimas protestaram em frente ao Instituto Médico Legal (IML), cobrando a identificação e liberação dos corpos. Em nota divulgada à imprensa, o próprio IML informou que ainda realizava exames e não havia concluído as identificações, reforçando suspeitas de execuções sumárias e mortes de pessoas rendidas.
Ao ser informado da recusa, o ministro Lewandowski entrou em contato com o governador Cláudio Castro, que teria atribuído o episódio a uma “falha de comunicação”. No dia seguinte, sexta-feira (31), o secretário Victor Cesar Carvalho dos Santos enviou novo ofício ao ministério restringindo a colaboração da PF à perícia balística e ao rastreamento de armamento apreendido com criminosos, além de solicitar apoio do Instituto Nacional de Identificação (INI) para reconhecer suspeitos oriundos de outros estados.
Na prática, o Rio autorizou a PF a atuar somente sobre as armas dos mortos, sem acesso às armas usadas pelos policiais — o que limita a possibilidade de reconstrução completa dos confrontos e de eventual responsabilização de agentes públicos.
A decisão acentuou o clima de tensão entre os governos estadual e federal, especialmente entre a cúpula da Polícia Federal e a Secretaria de Segurança do Rio, que defendem enfoques distintos sobre transparência e controle externo das operações policiais.
Até o fechamento desta reportagem, o governo do Rio não havia se manifestado sobre a dispensa dos peritos federais. Caso haja resposta, o texto será atualizado.




