Defesa tenta converter detenção em discurso político; bastidores revelam pressão sobre Ibaneis Rocha e ofensiva contra Alexandre de Moraes
Por Sandra Venancio
A semana promete ser decisiva para o futuro político e pessoal de Jair Bolsonaro (PL). O ex-presidente, condenado a 27 anos e 3 meses de prisão, deve ser transferido nos próximos dias para o Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília. Nos bastidores, a movimentação é intensa: aliados, advogados e figuras do próprio governo do Distrito Federal articulam uma operação para reduzir o impacto do encarceramento e, se possível, abreviá-lo.
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Bastidores de uma prisão anunciada
A iminente prisão de Bolsonaro mobiliza o Palácio do Buriti, o Supremo Tribunal Federal (STF) e a cúpula do PL. Fontes próximas ao governador Ibaneis Rocha (MDB) confirmam que há pressões diretas de interlocutores do ex-presidente para garantir condições especiais de detenção e até a possibilidade de regresso antecipado à prisão domiciliar.

A aposta mais recorrente entre aliados é que Bolsonaro deve passar menos de uma semana na Papuda, antes de ser novamente transferido para a mansão alugada pelo PL no Solar de Brasília, onde o clã presidencial está instalado desde o fim do governo.
Um assessor próximo ao ex-presidente descreve o período de reclusão como “o último ato de humilhação pública imposto por Alexandre de Moraes”, numa referência ao ministro do STF que conduziu o julgamento. Segundo essa visão, a estratégia da defesa é transformar o episódio em mais um capítulo de perseguição política.
O dossiê médico e o “piripaque” programado
Nos últimos dias, os advogados Celso Villardi e Paulo Amador Cunha Bueno encomendaram um documento técnico a uma equipe médica formada por um cirurgião, um clínico geral e um dermatologista. Internamente, o relatório já é chamado de “dossiê anti-Papuda”.
O material pretende demonstrar riscos à saúde de Bolsonaro e justificar o pedido de prisão domiciliar imediata. Entre os argumentos, estão supostos problemas de refluxo, soluços constantes, vômitos, pressão alta, apneia e complicações abdominais decorrentes das cirurgias realizadas após o atentado de 2018. Também é citado um diagnóstico de câncer de pele, usado para reforçar a alegação de que o ex-presidente teria de evitar exposição e estresse prolongado.
A estratégia foi antecipada por colunistas como Mônica Bergamo e Malu Gaspar, e reforçada por declarações públicas de Flávio Bolsonaro (PL-RJ). O senador acusou Alexandre de Moraes de submeter o pai a “tortura psicológica” e cobrou “limites” na execução da pena.
Pressões sobre o governo do DF
O caso também expôs o dilema político do governador Ibaneis Rocha, que busca reeleição e corteja o apoio do bolsonarismo. O secretário de Administração Penitenciária do DF, Wenderson Souza e Teles, enviou ofício pedindo que Bolsonaro seja submetido a uma avaliação médica antes da transferência, com o argumento de verificar a “compatibilidade entre seu quadro clínico e as condições do sistema prisional”.
Fontes próximas ao governo local afirmam que Ibaneis teme o impacto político de um eventual agravamento de saúde do ex-presidente durante a detenção.
O movimento é interpretado como uma tentativa de blindar o governo distrital de um possível desgaste público, caso a prisão tenha desdobramentos graves.
A cena na Papuda
No Complexo da Papuda, a cela reservada para Bolsonaro passa por ajustes de segurança. O objetivo é “verificar as condições do espaço”, embora fontes da Secretaria de Administração Penitenciária afirmem que o tratamento será “igual ao de qualquer outro detento”.
Narrativa de martírio
A ofensiva jurídica e política de Bolsonaro repete um padrão já conhecido: usar a própria vulnerabilidade como ferramenta de mobilização. A construção do discurso de “perseguição e martírio” é vista por estrategistas do PL como essencial para reagrupar a base radical e reverter o isolamento político do ex-presidente.
Enquanto isso, a defesa jurídica tenta ganhar tempo, explorando brechas médicas e processuais para adiar ou transformar a prisão em domiciliar monitorada.
Nos bastidores, há quem diga que a verdadeira disputa, neste momento, não é apenas pelo destino pessoal de Bolsonaro, mas pela sobrevivência política do bolsonarismo — e a Papuda, nesse enredo, será apenas o palco.




