Investigação da Polícia Federal aponta rede criminosa que operava dentro e fora do INSS, desviando recursos de aposentados entre 2019 e 2024. Estima-se que o prejuízo chegue a R$ 6,3 bilhões
Por Sandra Venancio – Jornal Local
A Polícia Federal prendeu nesta quinta-feira (13) o ex-presidente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Alessandro Stefanutto, suspeito de envolvimento em um esquema de descontos ilegais aplicados a aposentados e pensionistas em todo o país. A operação, batizada de Sem Desconto, investiga uma estrutura que teria atuado durante ao menos cinco anos e causado um rombo estimado em R$ 6,3 bilhões aos cofres públicos.
>> Siga o canal do Jornal Local no WhatsApp
Stefanutto, que comandou o INSS entre julho de 2023 e abril de 2024, foi alvo de mandado de prisão preventiva expedido pela Justiça Federal após novas provas indicarem sua participação no núcleo político-administrativo do esquema. Ele havia sido demitido do cargo no início deste ano, quando o caso se tornou público.

A investigação, conduzida em conjunto com a Controladoria-Geral da União (CGU), apura o funcionamento de associações fictícias de aposentados que realizavam descontos automáticos em benefícios, sem consentimento dos titulares. Essas entidades alegavam oferecer assistência jurídica e convênios de saúde, mas não prestavam nenhum serviço efetivo.
Políticos e ex-ministros também são investigados
Além de Stefanutto, a operação atinge nomes da alta cúpula da Previdência e do Legislativo. Entre os alvos de busca e apreensão estão o ex-ministro da Previdência Ahmed Mohamad Oliveira, que passará a usar tornozeleira eletrônica, o deputado federal Euclydes Pettersen (Republicanos-MG) e o deputado estadual Edson Araújo (PSB-MA).
As ordens judiciais foram cumpridas em 15 estados e no Distrito Federal, com 63 mandados de busca e apreensão e dez de prisão. Até o início da tarde, seis pessoas haviam sido presas.
De acordo com a PF, o grupo é investigado pelos crimes de organização criminosa, corrupção ativa e passiva, estelionato previdenciário e falsificação de dados em sistemas públicos, além de lavagem de dinheiro e ocultação de patrimônio.
Como operava o golpe
O esquema se consolidou entre 2019 e 2024, segundo os investigadores. A fraude se baseava em uma rede de intermediários ligados a servidores públicos, sindicatos e empresas privadas.
Esses agentes inseriam, nos sistemas do INSS, autorizações falsas de filiação a associações que cobravam mensalidades de aposentados e pensionistas. Os valores, embora pequenos individualmente, somavam milhões de reais mensais desviados das contas dos beneficiários.
As “associações” existiam apenas no papel: não possuíam sede, atendimento ou funcionários. Parte do dinheiro era distribuída em propinas a servidores e políticos que facilitavam a inclusão dos descontos. O restante era lavado por meio de empresas de fachada registradas em diferentes estados.
O ministro da CGU, Vinícius de Carvalho, confirmou que 11 entidades já tiveram suas atividades suspensas. A lista inclui instituições com nomes genéricos de “defesa do aposentado” e “assistência social”, usadas para mascarar a movimentação financeira.
Crise política no PDT e queda de Lupi
A operação atinge em cheio o Partido Democrático Trabalhista (PDT), que indicou Stefanutto à presidência do INSS durante a gestão de Carlos Lupi no Ministério da Previdência. A pressão política e o desgaste com as denúncias levaram Lupi a pedir demissão do cargo em abril.
O ex-ministro foi substituído por Wolney Queiroz, então secretário-executivo da pasta, que tenta reestruturar o órgão e recuperar a credibilidade da autarquia após a revelação do escândalo.
Embora negue envolvimento, Stefanutto é apontado pela PF como elo político central do esquema, responsável por garantir indicações de cargos estratégicos e pela blindagem administrativa de entidades suspeitas.
Linha do tempo da Operação Sem Desconto
- 2019 – Início das fraudes, com registros de autorizações falsas em sistemas do INSS.
- 2021 – CGU detecta aumento anormal de reclamações sobre descontos indevidos em benefícios.
- 2023 – Alessandro Stefanutto assume a presidência do INSS indicado pelo ministro Carlos Lupi (PDT).
- Abril de 2024 – Primeira fase da Operação Sem Desconto é deflagrada; Stefanutto é afastado do cargo.
- Novembro de 2025 – PF cumpre nova rodada de mandados e prende Stefanutto e outros envolvidos.
Próximos passos da investigação
Os investigadores agora rastreiam contas bancárias no exterior e transferências de recursos para empresas de fachada ligadas ao grupo. Somente nesta fase, já foram bloqueados R$ 320 milhões em bens e aplicações financeiras.
A PF deve aprofundar o cruzamento de dados com o Banco Central e a Receita Federal para identificar o destino final do dinheiro desviado.
A defesa de Stefanutto afirmou, em nota, que o ex-presidente “não participou de qualquer ato ilícito” e que sua prisão é “medida desnecessária e desproporcional”.




