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sábado, setembro 21, 2024

Servidores da FUNAI visitam malocas

Data:

As informações quanto à época do primeiro contato dos Matis com funcionários da FUNAI variam de 25 de agosto de 1975 a 21 de dezembro de 1976, através de um primeiro contato com uma mulher e uma criança de colo em um tapirí no igarapé Aurélio, afluente da margem direita do alto Itui. A partir desse período, os Matis começam a empreender sucessivas visitas ao Posto da FUNAI estabelecido no alto Ituí para obterem facões, machados, cachorros, galinhas, etc. Em 1978 servidores da FUNAI visitam as malocas Matis passando alguns dias entre eles. A partir desse momento os contatos tornam-se mais freqüentes.
O número populacional dos Matis na época do contato possui estimativas muito variadas: de 150 pessoas a cerca de 300 pessoas. Os próprios Matis falam que eram “muitos” antes do contato e que vários adultos morreram de uma febre, mas faltam dados para uma estimativa mais correta.
Viviam tradicionalmente em grupos familiares em 5 malocas distantes entre si, com população variável:
A presença de madeireiros e seringueiros em mau estado de saúde e sem assistência nas proximidades dos Matis recém contatados, e mesmo a falta dos devidos cuidados no contato por parte dos funcionários do Posto, contagiaram os Matis desde cedo e a partir de 1978 começam as epidemias de gripe, tosse, disenteria, etc. Entre 1976 e 1980 foram notificados 12 mortes ocasionadas por várias doenças e entre junho de 1981 e junho 1982 morreram 48 Matis devido a duas epidemias de gripe que logo se transformava em pneumonia . Em apenas um ano, a população Matis passou de 135 para 87 pessoas com a morte de 35% de sua população. Em 1985, três anos após essas epidemias um censo populacional realizado pela Campanha Javari revela que apenas sete pessoas possuíam mais de 40 anos, e somente um homem e duas mulheres acima de 50 anos.
Devido ao grande número de mortes em cada grupo familiar, os Matis tiveram que se reestruturar, adaptando suas regras de casamento e relações sociais e políticas entre os diversos grupos. Com isso os sobreviventes formaram basicamente dois grupos que se mantêm até hoje.
Indagado sobre a região de origem do grupo, o velho Binã afirmava que antes moravam entre o Curuça e o Ituí sem saber dizer quando atravessaram para a margem direita . Os sobreviventes da epidemia não se lembravam, todos os mais velhos haviam morrido e a memória do grupo remonta a época em que já viviam na área compreendida entre os rios Ituí, Itaquai e Branco, (afluente da margem esquerda do Itaquaí).
A partir do início do contato os Matis começam a estabelecer relações com os Marubo que funcionavam como ‘interpretes’ apesar de falarem línguas diferentes, mas ambas do grupo lingüístico Pano. Várias famílias Marubo desceram do alto Ituí e se fixaram no PIA localizado no médio curso daquele rio, atraídos pela presença da FUNAI, intensificando o contato com os Matis. As conseqüências dessa aproximação entre um grupo – os Marubo com mais de um século de contato com a sociedade envolvente – e os Matis recém-contatados, se fizeram sentir em relação a saúde e nas interferências culturais.
Em 1982, na tentativa de solucionar os problemas de interferência causados por não-índios e pelos Marubo, a FUNAI decide transferir os sobreviventes Matis e as instalações do Posto para o igarapé Boeiro, onde passam a residir em duas malocas (Melatti, 1983). No igarapé Boeiro os Matis passam por um período de grande escassez alimentar devido a falta de roças levando-os a roubar, várias vezes, alimentos das roças dos ribeirinhos e dos Marubo do antigo posto. Além disso, o referido igarapé era um local difícil para se obter veneno para as setas de zarabatanas e o ‘tatchi’ um chá tradicional e de grande importância espiritual. O inicio desse processo de sedentarização e concentração populacional em um único local diminuiu a mobilidade do grupo e criou um processo de maior conflito entre os subgrupos. Em 1987 os Matis se mudam para uma área próxima ao Rio Novo
Enquanto a estrutura tradicional da Funai de Atalaia do Norte vai se tornando cada vez mais sucateada e ineficiente, o rio Ituí vai se povoando rapidamente com colocações de seringueiros e jiraus maiores, além da invasão de centenas de madeireiros no território Matis (Melatti, 1983). Este cenário começa a se alterar com a Funai em 1987 instituindo o Departamento de Indios Isolados e marcando o início de uma nova política em relação aos índios isolados (substituindo a política de atração pela proteção); em 1996 estabelecendo o Posto de Proteção na confluência do Ituí e Itacoaí; e demarcando em 1998 a Terra Indígena do Vale do Javari. É importante ressaltar que a Campanha pelo Vale do Javari, na época, teve um papel importante na mobilização da sociedade civil cobrando do estado brasileiro medidas efetivas de proteção e assistência aos povos indígenas do Vale do Javari.
Em 1993 os Matis se estabelecem na margem esquerda do Ituí a montante do igarapé Jacurapá. E em 1998 se sentindo cercados pelos Marubo do alto Ituí, rio acima, e pelos Marubo do antigo PI Ituí na foz do rio Novo, rio abaixo, além da escassez de alguns recursos, constroem uma nova aldeia no igarapé Aurélio, rio abaixo. Vivem nesse local até hoje, distribuídos em 3 grandes malocas na foz do igarapé Aurélio. A primeira próxima a foz desse igarapé com o rio Ituí, a segunda se localiza a 400 metros a partir dessa outra maloca a montante do igarapé Aurélio através de um varadouro e a terceira também a uns 400 metros dentro da mata a partir da primeira, sendo um grupo familiar que resolveu se distanciar fisicamente dessa primeira maloca. Parece que hoje como tentativa de evitarem os conflitos internos do grupo, decorrentes da sedentarização e concentração populacional, estão se reorganizando com os chefes de cada família voltando a construir suas malocas separadas, mas próximas entre si.
Após o período trágico e traumático de mortes decorrente desse contato irresponsável da FUNAI, principalmente entre os anos de 1981 e 1982 (que ocasionou toda uma enorme geração de órfãos, atualmente muito dos jovens adultos na faixa acima de 26 anos são órfãos ou perderam grande parte de seus parentes), sinais de recuperação do grupo começam a aparecer. Passam de 87 pessoas em 1983 a 123 em dezembro de 1987 apesar da ameaça de infertilidade devido a introdução de gonorréia. Em 1995 já totalizam 176 e hoje estão em torno de 240 pessoas com cerca de 50% da população constituída por pessoas com menos de 16 anos sendo que em 1980, um ano antes da grande epidemia, essa parcela da população compreendia apenas 22% da população total.
O contato constante com os Marubo do Rio Novo de Cima, aldeia formada pelos Marubo, trouxe novas alianças para eles mas também fortes influências na sua vida cultural. É comum nos discursos dos mais jovens a idéia de que “Marubo é bom e Matis é ruim”, principalmente por estes dominarem bem a relação com os não-índios e pelos Matis passarem por um processo de baixa estima, inclusive com várias jovens mulheres Matis se apresentando e se pintando como verdadeiras mulheres Marubo, abandonando o visual tradicional Matis.
Atualmente os Matis tentam participar do novo cenário político da região através do CIVAJA (Conselho Indígena do Vale do Javari), através dos seus conselheiros e das reuniões anuais; mas apesar de grande esforço por parte deles encontram-se em desvantagem diante dos outros grupos numericamente superiores e com várias décadas de conhecimento do mundo dos não-índios. Em parte compensam isso através de alianças próprias formadas através da Frente de Proteção Etno-Ambiental do Vale do Javari, cujo Posto está instalado na confluência dos rios Ituí-Itaquaí (ver projetos).
www.trabalhoindigenista.org.br

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