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sábado, setembro 21, 2024

A Medicina se volta para a preservação da fertilidade da paciente com câncer

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A incidência do câncer cresce no Brasil, como em todo o mundo, num ritmo que acompanha o envelhecimento populacional decorrente do aumento da expectativa de vida. O aumento da doença é resultado das transformações globais das últimas décadas, que alteraram a situação de saúde dos povos devido à urbanização acelerada, novos modos de vida, novos padrões de consumo. No Brasil, segundo estimativas apresentadas pelo INCA, Instituto Nacional do Câncer, só em 2006, 472 mil novos casos de câncer seriam registrados entre a população. Os tipos mais incidentes, à exceção de pele não melanoma, são os de próstata e pulmão no sexo masculino e mama e colo do útero no sexo feminino.

Uma das questões mais delicadas em relação ao tratamento de mulheres jovens com o diagnóstico de câncer é o comprometimento da fertilidade.
”Dependendo do estágio do tumor, elas terão de ser submetidas à quimioterapia e/ou radioterapia, que podem, em muitos casos, afetar a capacidade reprodutiva desta paciente”, afirma o médico Joji Ueno (CRM-SP 48.486), especialista em Reprodução Humana. Muitas pacientes jovens que têm o câncer diagnosticado não abrem mão da maternidade, mesmo sabendo que há maior chance de reincidência do câncer no período de cinco anos, se engravidarem. “Por isso, o tratamento deve ser muito discutido”, defende o médico.

“Os efeitos esterilizantes dos tratamentos contra o câncer podem resultar tanto em perda da função uterina normal, como na destruição total ou parcial da reserva de óvulos no ovário”, explica Joji Ueno, diretor da Clínica Gera. Por isto, antes das sessões que quimioterapia e/ou radioterapia, as mulheres portadoras de câncer interessadas em engravidar recorrem à fertilização in vitro. As chances de gravidez com este procedimento fixam-se em torno de 30% a 40%.

Para a preservação da capacidade reprodutiva das pacientes com câncer, uma das alternativas é o congelamento dos óvulos, pois a infertilidade causada pelo tratamento da doença pode ser permanente. “O óvulo pode ser congelado por vários anos. Depois da cura do câncer, a fertilização será feita com o esperma do homem que será o pai”, diz o médico. A técnica, porém, ainda apresenta poucos resultados positivos no mundo. “As condições para gravidez com óvulos congelados, atualmente, atingem 20%”, afirma Joji Ueno.

Outra opção terapêutica é o congelamento de pré-embriões. “O congelamento de pré-embriões sempre gerou uma discussão social muito fervorosa, principalmente devido a questões éticas e religiosas. O embrião também pode se manter congelado por um tempo indefinido, mas muitas religiões consideram que a vida se inicia no momento da concepção. O embrião, portanto, é tratado como um ser vivo, e seu eventual descarte pode ser considerado uma conduta anti-ética”, explica Joji Ueno, coordenador do curso de pós-graduação, Especialização em Medicina Reprodutiva, ministrado pelo Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio Libanês, em São Paulo. Uma outra dificuldade do congelamento de pré-embriões é que, se a mulher quiser implantá-los, terá de pedir autorização ao pai, ou seja, ao parceiro que fecundou o óvulo.

Por fim, há também a possibilidade de fazer o congelamento de fragmentos do ovário, que posteriormente, podem ser transplantados novamente para a paciente ou submetidos a uma técnica laboratorial de amadurecimento in vitro. Ao se submeter à quimioterapia ou/e à radioterapia, os folículos dos ovários da paciente portadora de câncer serão destruídos e não se recomporão mais. “Por isso, o especialista em Reprodução Humana faz a retirada de uma parte superficial destes órgãos, antes da mulher se submeter a estes tratamentos. Esses fragmentos podem ser reimplantados mais tarde, em seu organismo, e a mulher passará a ovular normalmente de novo”, explica o médico. “Poderão se beneficiar do congelamento de fragmentos do ovário mulheres com câncer de mama, de colo de útero, e ainda, leucemia, linfoma e sarcomas”, afirma Joji Ueno. Esta técnica é empregada no Brasil em fase de pesquisa, os médicos ainda buscam a obtenção de uma gestação com nascimento.

Novas pesquisas

Entre os dias 01° e 04 de julho, a cidade de Lyon, na França, sediou a 23ª Conferência Anual da Sociedade Européia de Reprodução Humana e Embriologia. O evento que reuniu especialistas em reprodução humana do mundo todo apresentou novidades e avanços no campo da reprodução humana assistida. “A preservação da fertilidade do paciente com câncer foi um dos pontos fortes dos estudos e pesquisas apresentados durante o evento”, afirma Joji Ueno.

Uma das notícias que mais repercutiram durante o evento foi o anúncio do nascimento do primeiro bebê concebido mediante um óvulo maturado em laboratório, antes de ser congelado e fecundado, que nasceu no Canadá. A menina é filha de uma das 20 pacientes estéreis que participaram de uma experiência dirigida pelo Dr. Hananel Holzer, no centro de reprodução McGill, de Montreal. Outras três estão atualmente grávidas, informou o médico. Segundo o Dr. Holzer, a notícia pode ser muito boa para se preservar a fertilidade, em particular em pacientes que não podem ser submetidas a uma estimulação ovariana ou para aquelas que não têm tempo suficiente para realizá-la. Como a pesquisa, ainda se encontra em fase preliminar, não foram obtidos resultados em pacientes com câncer. As 20 pacientes, de uma média de 30 anos, tinham ovários policísticos, uma enfermidade causadora de esterilidade e que afetaria entre 4 e 12% das mulheres em idade de procriação. “Penso que dois grupos de mulheres poderão ser beneficiados por essa técnica: as jovens com câncer que vão poder retirar seus óvulos antes da quimioterapia e as mulheres com a Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP)”, diz Joji Ueno. É preciso mais tempo e mais pesquisas antes desta técnica poder ser considerada uma opção segura para mulheres com câncer. Também é necessário muito mais aprofundamento para assegurar que não haverá defeitos genéticos em bebês nascidos por meio dessa técnica. “No que diz respeito às mulheres com SOP, a técnica pode resolver a questão dos óvulos, mas não resolve o processo de implantação do embrião no útero”, explica o médico.

Outra boa nova para a preservação da fertilidade das pacientes com câncer veio de Israel. Cientistas israelenses estão congelando óvulos e tecidos ovarianos de meninas entre 5 e 10 anos de idade portadoras de câncer. O Dr. Ariel Revel, do departamento de Obstetrícia e Ginecologia do Hospital da Universidade de Hadassah, Jerusalém, em Israel, disse que o aumento dos sobreviventes entre as crianças que tiveram câncer na infância torna estas medidas muito importantes para preservar a fertilidade destas meninas. Segundo o médico, os cânceres infantis resultam, geralmente, em taxas de cura entre de 70% e de 90% dos casos. Entretanto, a quimioterapia, frequentemente necessária, torna estas crianças, adultos estéreis. Nas mulheres adultas portadoras de câncer, os ovários são estimulados a produzir os óvulos, que são removidos, fertilizados e congelados. Nas crianças, este procedimento não é possível, e o método que vem sendo empregado congela o tecido ovariano também, que contém os folículos ovarianos, para futuro transplante. “Assim, as chances destas crianças tornarem-se mães aumentam”, afirma o especialista em Reprodução Humana.

Uma terapia nova, apresentada durante o evento, é a mais nova esperança para proteger a fertilidade das mulheres com câncer e de doenças auto-imunes, tais como o lúpus. O Dr. Kate Stern, pesquisador de Melbourne, Austrália, apresentou estudo piloto mostrando como o hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH) pode proteger o ovários das mulheres que se submetem à quimioterapia. Os análogos do GnRH são usados geralmente no tratamento das desordens hormonais femininas e nas terapias de FIV. O Dr. Stern e sua equipe estão terminando uma continuação de cinco anos do estudo piloto e se dizem otimistas quanto aos resultados.

Os avanços nos tratamentos contra o câncer, envolvendo cirurgias, radioterapia e quimioterapia, além das tecnologias para a preservação da fertilidade têm possibilitado à medicina oferecer opções de preservação da fertilidade para os indivíduos com câncer que desejam ter filhos. “É importante que ginecologistas, especialistas em Reprodução Humana e oncologistas conheçam e informem a estes pacientes as opções disponíveis para a preservação da fertilidade”, afirma Joji Ueno.

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