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sexta-feira, outubro 31, 2025
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Documentos da Polícia indicam que dois agentes foram mortos antes do cerco na mata que terminou com 121 mortos no Rio

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Registros obtidos pelo ICL Notícias mostram que ao menos dois dos quatro policiais mortos na operação dos complexos do Alemão e da Penha foram baleados antes da ofensiva na área de mata da Vila Cruzeiro, onde ocorreu o maior número de mortes

Por Sandra Venancio

Os registros de ocorrência da Delegacia de Homicídios da Capital (DHC), obtidos pelo ICL Notícias, revelam que parte dos policiais mortos na megaoperação de terça-feira (28) — que terminou com 121 mortos, sendo 117 civis — foi atingida antes do cerco na área de mata conhecida como Vacaria, no alto da Vila Cruzeiro, Zona Norte do Rio de Janeiro.

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As informações enfraquecem a narrativa oficial de que o confronto mais letal se concentrou apenas em área desabitada, escolhida para “preservar a vida dos moradores”. Segundo os documentos, os agentes já sabiam da morte de colegas antes de intensificarem o cerco na mata — local apontado por moradores e peritos como o epicentro da chacina.

Segundo os documentos, os agentes já sabiam da morte de colegas antes de intensificarem o cerco na mata — local apontado por moradores e peritos como o epicentro da chacina. Foto Reprodução Redes Sociais

Mortes antes da entrada na Vacaria

De acordo com o relatório da DHC, o chefe de investigações da 53ª DP (Mesquita), Marcus Vinícius Cardoso de Carvalho, e o 3º sargento do Bope, Cleiton Serafim Gonçalves, foram baleados ainda na área habitada da Vila Cruzeiro, nas primeiras horas da operação.

Marcus Vinícius, conhecido como “Máscara”, foi o primeiro a ser morto, por volta das 9h, três horas após o início da incursão. Ele e outros agentes tentavam cumprir mandados de prisão quando se abrigaram em uma laje na Rua Nossa Senhora Aparecida — um dos acessos principais à mata. O delegado assistente da DRF, Bernardo Leal Anne Dias, foi ferido na perna no mesmo local e permanece internado em estado grave.

O segundo policial morto, o sargento Cleiton Serafim, foi baleado às 10h04, durante uma tentativa de remover barricadas no Areal, já no limite entre os complexos do Alemão e da Penha. O Bope formava, naquele momento, uma linha de contenção apelidada de “muro do Bope”, no alto da Serra da Misericórdia, enquanto a Polícia Civil avançava pela Vila Cruzeiro, empurrando os traficantes para a área de mata.

Cerco na mata e o “bunker de pedra”

Os outros dois policiais mortos — o civil Rodrigo Velloso Cabral e o sargento do Bope Heber Carvalho da Fonseca — morreram já na Vacaria, onde se concentrou o confronto mais intenso. O local, de mata fechada e encostas íngremes, foi descrito em depoimentos como um “bunker de pedra” utilizado pelos criminosos para resistir ao avanço das forças de segurança.

Em relato anexado ao registro, um militar afirmou que, ao chegar à região, “encontraram o policial civil Cabral já em óbito, caído ao solo, e logo depois foram emboscados por criminosos fortemente armados que efetuaram diversos disparos e lançaram uma granada contra os militares”.

Cabral havia ingressado na Polícia Civil há apenas 40 dias. Segundo os depoimentos, os atiradores que o alvejaram seriam os mesmos responsáveis pelos disparos que atingiram Fonseca e o subtenente Luís Cláudio Fernandes Leal, ferido na mesma ação.

Contradições na versão oficial

Apesar das evidências de que parte dos confrontos ocorreu em zonas residenciais, o secretário de Segurança, Victor Santos, e o comandante da PM, Marcelo Menezes, defenderam que a estratégia foi “levar o confronto para a mata” para evitar riscos à população civil.

Os registros, no entanto, mostram que os primeiros policiais foram mortos ainda nas ruas da Vila Cruzeiro, antes da movimentação em direção à mata. A decisão de intensificar o cerco após essas mortes, segundo fontes ligadas à investigação, teria provocado a escalada do confronto que resultou na maior tragédia policial da história recente do país.

Área isolada e corpos resgatados por moradores

Moradores relataram que os corpos começaram a ser resgatados apenas horas após o fim da operação, com ajuda de voluntários. Muitos estavam crivados de tiros e sem identificação. Vídeos que circulam nas redes sociais mostram filas de cadáveres alinhados em trilhas de terra na Vacaria.

A Polícia Civil afirma que ainda não é possível confirmar a identidade de todas as vítimas civis e que a perícia busca diferenciar mortos em confronto de possíveis execuções. Organizações de direitos humanos pedem o envio de observadores independentes e a preservação da cena do crime, sob risco de destruição de provas.

Contexto e repercussão

A operação — que começou oficialmente para cumprir mandados contra traficantes ligados ao Comando Vermelho — teve o apoio de mais de 600 agentes, com blindados, helicópteros e drones. O saldo de 121 mortos, incluindo quatro policiais, 21 presos e centenas de casas danificadas, provocou reação nacional e internacional.

O Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos, a Human Rights Watch e a Anistia Internacional cobraram investigação independente e alertaram para o padrão de letalidade policial no Rio de Janeiro.

Enquanto isso, o governador Cláudio Castro (PL) — elogiado por governadores aliados — promoveu a criação do “Consórcio de Paz”, união de estados comandados por políticos bolsonaristas para “integrar políticas de segurança”.

O movimento é visto por analistas como uma resposta política ao Planalto e uma tentativa de transformar o episódio em trampolim eleitoral, em um momento de crise institucional e disputa narrativa sobre quem deve responder pela chacina.

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