O prefeito Jonas Donizette assinou no dia Dia Mundial da Água (22), o decreto de desapropriação de área rural de Sousas para a construção de um reservatório de água que faz parte do projeto “Nosso Cantareira”, da Prefeitura Municipal de Campinas e Sociedade de Abastecimento de Água e Saneamento – SANASA.
Para a construção do reservatório será necessário a desapropriação de 3,5 milhões de metros quadrados da zona rural do distrito de Sousas, onde XX moradores vivem no entorno dos rios Jaguari e Camanducaia.
Anunciada como principal solução para sanar a falta de água na RMC (Região Metropolitana de Campinas), a megaobra da barragem, estimada em R$ 350.875.003,46, em Pedreira e Amparo, será construída após a desapropriação de famílias no entorno dos rios Atibaia, Jaguari e Camanducaia.
Para o Ministério Público, segundo o promotor Rodrigo Sanches Garcia, do Gaema Campinas, esclarece que não existe inquérito de 2015 relacionado ao reservatório, porque até então não se sabia qual seria a área de instalação dele. Recentemente a promotoria solicitou à Sanasa cópia do estudo ambiental e está aguardando que responda para analisar a situação do reservatório de água bruta de Campinas, barramento Atibaia.
Consultada, a CETESB informou, que a Licença Prévia de nº 2.513 foi emitida em 25/08/16, e a diretoria de Avaliação de Impacto Ambiental que trata dos reservatórios Pedreira e Duas Pontes, a serem implantados nos municípios de Campinas, Amparo e Pedreira, estão sob a responsabilidade do DAEE. Quanto a Licença de Instalação (LI), a mesma ainda não foi sequer solicitada pelo DAEE, portanto não temos como definir prazo para a sua emissão. Quanto às áreas ocupadas, as intervenções nas mesmas só poderão ocorrer após o atendimento das exigências da Licença Prévia e a emissão da LI.
Durante visita a Campinas no dia 2, o governador Geraldo Alckmin informou que a obra dos reservatórios de Pedreira e de Duas Pontes deve sair do papel a partir de agosto e sejam concluídas em 2020.
Situação das Famílias
Moradores vivem o drama da incerteza e dizem que com a saída perderão o “fôlego de vida”. Ao rechaçarem o novo reservatório, famílias falam em resistir às investidas do Estado e até “sair na bala” se preciso para proteger suas casas e propriedades. Alguns ainda criticam a imposição e falta de informações a respeito do valor das indenizações.
Em fevereiro do ano passado, a reportagem do Jornal Local entrevistou as famílias que moram no local. Moradores da Fazenda Roseira estão insatisfeitos. “As inundações vão pegar 20 alqueires, o espaço de gado e eucalipto. Vamos pra rua. Não temos onde morar”, relatou o administrador Leonildo Assunção Sales, 33.
Damião Lino Moreira, de 60 anos, é um dos que mais sofrem com a chance, cada mais real, de perder seu valioso hectare (o equivalente a 10 mil metros quadrados). Entristecido com a situação, Damião revelou que de alguns meses pra cá, sua esposa anda tão abalada com a sombra da desapropriação que teve até princípio de AVC (Acidente Vascular Cerebral).
“Aqui é nossa vida. Estamos nesse lugar há mais de 20 anos. Tudo que construí está aqui. Com 60 anos, vamos começar a vida onde? Ninguém nem fala pra onde vamos”, se revoltou o idoso, que se diz preocupado diante das intransigências do futuro.
“Já perdi meu sono faz tempo. Minha esposa está doente. Teve princípio de AVC quando pessoas ligadas ao governo vêm nos perturbar falando que temos de sair. Minha mulher tem um comércio (bar) aqui. Vamos sair perdendo em tudo”, esbravejou ele, que já precisou se desfazer da lavoura e criação de animais, usadas como fonte de renda.
Mulher de Leonildo, a doméstica Michelle Lídia de Souza Sales, 30, apela a Deus. “Deus poderia fazer alguma coisa pra não deixar isso acontecer. Minha pressão aumentou depois que vi pessoas do governo vindo tirar fotos da fazenda. Uns falam que vamos sair em 2016 e outros em 2017”, contou.
Michelle afirma que vai perder a qualidade de vida que tem. “Ouço o fino barulho de uma queda d’ água a menos de 5 metros do portão de casa, e agora que estamos bem vai acontecer isso. Nem durmo mais de tão angustiada, porque além de tudo vamos ficar desempregados e com essa crise está difícil achar serviço”.
A indignação dos moradores também gira em torno do que nomearam de “imposições do governo”, como a proibição de construção e ampliação das propriedades a serem destruídas pela força da água, além da ausência de informações relacionadas ao preço a ser oferecido pelo governo aos proprietários de sítios e fazendas.
“A última reunião que teve sobre isso foi em novembro. Disseram que iriam começar a desapropriação em março, mas parece que nem projeto pronto pra isso ainda tem”, falou Damião.
Indenizações
O Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) informou que ‘já concluiu o cadastramento das propriedades que serão desapropriadas e laudo de avaliação (valor) considerando benfeitorias e construções no imóvel. A desapropriação ocorrerá em duas etapas. A primeira é da área necessária para a construção das estruturas de engenharia da barragem. A segunda, da área dos lagos, quando as obras civis estiverem bem adiantadas. Após iniciadas, as obras terão prazo de 24 meses e a estimativa de investimento nas mesmas é de R$ 754 milhões’.
As obras são essenciais para a região. “O DAEE buscará firmar acordos consensuais com os proprietários e considera que, em caso de não se chegar a um acordo, caberá ao Poder Judiciário definir o valor justo da indenização”, finalizou o órgão, em nota.
Licenças Ambientais
O presidente do Conselho Gestor da Área de Proteção Ambiental de Campinas (Congeapa), Rafael Moya informou que o Conselho não foi convidado para apresentação do decreto de desapropriação. Sobre o parecer do Congeapa, Moya informou que o processo do reservatório passou pelo Congeapa, e devolvido com uma série de questionamentos.
O Congeapa também se preocupa com a possibilidade de acidentes ambientais e a dimensão do impacto social nas barragens por falta de fiscalização, o que foi refutado pelo DAEE (Departamento de Água e Energia Elétrica), braço do governo paulista na estruturação da obra.
“A qualidade da água, a segurança, os impactos na fauna e na flora não ficaram esclarecidos. Uma das propostas é com o barramento transportar para outro lado da barragem os peixes em caminhões quando houver concentração das espécies de um lado (do rio). Não há credibilidade”, argumentou à época o presidente do Congeapa.
Parecer técnico da Secretaria Municipal do Verde, Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável mostraram ainda o potencial de perdas de vidas humanas, e tem um “significativo impacto ambiental e alto impacto socioeconômico” por conta da concentração de instalações residenciais, comerciais, agrícolas e industriais. O dano potencial das obras foi classificado com 27 pontos – acima de 16 coloca o risco de dano em nível alto.
Construção do Reservatório
Os estudos para a construção do reservatório tiveram início em 2014, em meio à crise hídrica enfrentada pelo estado de São Paulo. Na época, a Sanasa prometeu a construção de 23 reser

vatórios elevados para o armazenamento de água tratada, mas até agora só cinco saíram do papel. Estão prontos, mas para começarem a funcionar dependem de interligação de rede e desinfecção. A previsão é que só comecem a receber água no fim de maio. Os outros 18 ainda não tem previsão de quando serão construídos, pois dependem de licitação.
Segundo a Prefeitura, o represamento do rio Atibaia trará independência do Sistema Cantareira, melhoria da qualidade da água e, consequentemente, redução de gastos com insumo, além de permitir geração de energia. “Em 2014 Campinas passou por uma grave crise hídrica e a população percebeu que a cidade não tinha um sistema de preservação próprio. Nós ainda somos dependentes do Sistema Cantareira e esse investimento garante a segurança hídrica de Campinas pelos próximos cinquenta anos”, anunciou.
A conclusão do reservatório ainda resultará na redução dos custos operacionais por meio da desativação da Captação e da Estação de Tratamento de Água (ETA) Capivari, e da redução de três conjuntos moto-bomba da Captação do Rio Atibaia.
Barragem
A barragem de Pedreira será construída no rio Jaguari, ocupará uma área de 4,35 quilômetros quadrados nos municípios de Pedreira e Campinas, e terá capacidade para acumular 32 milhões de metros cúbicos de água. Já a barragem de Duas Pontes, no rio Camanducaia, em Amparo, ocupará uma área de 8,9 quilômetros quadrados e terá capacidade para 53,3 milhões de metros cúbicos.
Estimado em R$ 350 milhões, o projeto será viabilizado pela administração municipal por meio de parceria público-privada, ou por meio de créditos obtidos junto ao Ministério das Cidades. As obras devem ser finalizadas em até três anos após o início dos trabalhos.