por André Monteiro
Conversar com Dacil Paioli Bertassolli é entrar nos tempos em que Sousas era ainda bem pequena – pode-se até sentir o cheiro de café fresco no ar, auxiliado pelo saboroso paladar dos doces caseiros feitos por ela mesma no fogão à lenha. A filha do ex-subdelegado Armando Paioli e D. Anaide nasceu e viveu em Sousas a vida inteira, e foi casada com o farmacêutico, subprefeito e vereador, Zezinho Bertassolli, união interrompida somente com seu falecimento. Mesmo representante da “velha-guarda” do distrito, ela é uma senhora ainda muito ativa, orgulhosa dos filhos e netos.
Sempre ao lado do marido, que por 40 anos esteve no balcão da única farmácia de Sousas na época, Dacil conta que seu marido fazia às vezes o papel de médico quando ainda não se tinha posto de saúde: “As pessoas vinham das fazendas de charrete a qualquer hora do dia ou da noite para se ‘consultar’ com meu marido, que manipulava as pomadas, remédios e comprimidos artesanalmente. Às vezes ele até ficava dias nas fazendas aplicando penicilina de três em três horas para cuidar das pessoas”. Ele era muito amigo dos médicos e sempre os acompanhava e encaminhava doentes para os hospitais de Campinas.
Dacil conheceu muitas pessoas por conta, inicialmente, da farmácia, que era um “ponto-chave” na região, onde todos paravam para conversar e se encontrar. Quando um desconhecido chegava em Sousas, era na farmácia que todos perguntavam quem era o “novato”. Cândido Fontoura, do biotônico famoso, a família Penteado e o Dr. Couto de Barros, que depois nomearam importantes logradouros em Sousas, eram freqüentadores assíduos da farmácia. Com a política, na qual o marido entrou quase que forçado pela sua grande popularidade, continuou lutando para conseguir melhorias em Sousas e Joaquim Egídio: “Meu marido é que era o vereador, mas eu sempre tive um jeito expansivo e não sossegava enquanto não conseguia as coisas”.
Zezinho Bertassolli foi duas vezes subprefeito e o primeiro vereador eleito majoritariamente por Sousas, e em seu mandato conseguiu o asfaltamento da rodovia Heitor Penteado, a construção da Capela do Cemitério, da Biblioteca Guilherme de Almeida e do Ginásio Estadual Manuel Alexandre Marcondes Machado. O Posto de Saúde e as casas populares também foram iniciativas suas, que sempre tentaram melhorar a qualidade de vida do distrito e gerar empregos, como a lei que exigia professoras residentes em Sousas nas escolas públicas e o atendimento médico preferencial a moradores locais.
Lions Clube, Regatas e Associação de Santa Rita foram locais em que Dacil Bertassolli participou ativamente. Há cinqüenta anos, junto com as amigas Marina Magalhães e Lídia Leoni, fundou a Casa da Criança de Sousas, inicialmente para ensinar trabalhos manuais como bordados e tecelagem às crianças e passou a contar com funcionários e atendimento médico. A parte espiritual ficava por conta do padre Antônio, da Igreja Matriz. Com o tempo a Casa foi se estruturando e ganhou funcionários, atendimento médico e orientação para mães.
Hoje em dia, nos conta, Sousas está bem diferente. “Conhecíamos todas as pessoas que passavam na rua, as portas todas ficavam abertas, a vizinhança era muito amiga. Na delegacia existia uma cadeia provisória, e os próprios delegados levavam a comida de casa para os presos. O tratamento era diferente, não se podia falar mal dos outros, pois se não era parente, era parente de algum parente. Éramos uma família só”.
Entre muitas histórias, Dacil lembra das festas de São Cristóvão na qual os carros dos fiéis eram benzidos na rua, dos bondes que levavam as pessoas até Campinas, e da festa que comemorou o final da II Guerra Mundial. “Era contagiante a alegria dos parentes de muitos sousenses que integraram a Força Expedicionária Brasileira na Itália. Todo mundo saiu na rua para celebrar o fim da guerra e saudar os familiares expedicionários”, conta.