Uruguai aprova lei que legaliza a eutanásia e se torna pioneiro na América do Sul

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Sob condições específicas e será encaminhada para sanção do presidente Yamandú Orsi, que já manifestou apoio à iniciativa. Foto RS/Fotos Publicas

Projeto “Morte Digna” foi aprovado no Senado e aguarda sanção do presidente Yamandú Orsi; país reforça tradição de avanços em direitos civis


Por Sandra Venancio

O Senado do Uruguai aprovou nesta quarta-feira (15) o projeto de lei que legaliza a eutanásia em todo o país, tornando o Uruguai o primeiro país da América do Sul a autorizar o procedimento. Conhecida como Lei da Morte Digna, a proposta foi apresentada pela Frente Ampla, coalizão de esquerda que governa o país, e obteve maioria confortável no plenário.

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A medida, discutida há mais de uma década, descriminaliza a morte assistida sob condições específicas e será encaminhada para sanção do presidente Yamandú Orsi, que já manifestou apoio à iniciativa. O texto prevê que apenas maiores de idade, mentalmente aptos, residentes no país e em estado terminal de doença incurável poderão solicitar o procedimento, mediante várias etapas formais e testemunhadas.

Tradição de leis progressistas

Com a decisão, o Uruguai reforça sua imagem de referência liberal na América Latina, juntando-se a países como Canadá, Espanha, Nova Zelândia e Países Baixos, onde a eutanásia é legal. Na região, apenas Colômbia (desde 1997) e Equador (desde 2024) haviam aprovado medidas semelhantes.

A aprovação da eutanásia segue a linha de outras leis pioneiras do país, como a descriminalização do aborto (2012), o casamento homoafetivo (2013) e a regulamentação da cannabis (2013).

Segundo pesquisa da consultoria Cifra, divulgada em maio, 62% dos uruguaios apoiam a legalização e apenas 24% se opõem — um reflexo do amplo respaldo social à medida.

Vozes do debate

Entre os rostos que simbolizam a aprovação está Beatriz Gelós, de 71 anos, diagnosticada com Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA). Em entrevista à AFP, ela celebrou a votação como um gesto de humanidade:

“É uma lei compassiva, muito humana, muito bem escrita. Me daria uma paz incrível poder escolher o momento de partir”, afirmou.

Florencia Salgueiro, ativista do grupo Empathy, destacou que a nova legislação “respeita a autonomia do indivíduo” e representa “um avanço civilizatório no direito de morrer com dignidade”.

Resistência e questionamentos éticos

Apesar do apoio majoritário, o projeto enfrentou forte oposição da Igreja Católica e de organizações civis que o consideram “deficiente e perigoso”. Em carta pública, Marcela Pérez Pascual, uma das signatárias contrárias, afirmou que “as pessoas mais vulneráveis estão sendo deixadas desprotegidas” e que o Estado deveria fortalecer os cuidados paliativos em vez de permitir a eutanásia.

Mesmo diante das críticas, parlamentares da Frente Ampla defendem que a lei estabelece salvaguardas rigorosas para evitar abusos, exigindo a manifestação expressa e documentada do paciente em todas as etapas.

Marco histórico para a região

Com a aprovação, o Uruguai entra para um seleto grupo de nações que reconhecem o direito à morte digna como parte da liberdade individual. Especialistas em bioética consideram a decisão um divisor de águas para a América Latina, onde o tema ainda enfrenta resistência cultural e religiosa.

“O Uruguai confirma sua vocação humanista. É o primeiro país sul-americano a reconhecer que o direito de viver com dignidade inclui também o direito de morrer com dignidade”, resumiu o jurista Germán Pizzorno, da Universidade da República.

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